quarta-feira, 21 de julho de 2010

Ananases, "abacaxis" e carne tenra


.................... Com o seu peculiar bairrismo militante e gosto desmesurado pelos superlativos, os portugueses, não contentes por terem um dos melhores, quiçá o melhor ananás do mundo, o ananás açoriano produzido em S.Miguel, logo quiseram também açambarcar o próprio nome do aromático fruto!
Sim senhor “Ananás há só um, o dos Açores e mais nenhum!”.
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Caiu-se assim no ridículo parolo de passar a chamar ananás só ao dos Açores e “abacaxi”, o termo brasileiro para ananás, a todos os outros. .
De facto há apenas uma espécie de ananás cultivado para consumo, o Ananas comusus, do qual se conhecem algumas dezenas de variedades e se cultivam meia dúzia.
O ananás dos Açores é de uma das variedades mais cultivadas em todo o mundo, a Cayenne e deve as suas portentosas qualidades de sabor e até morfológicas à impecável técnica com que é produzido nas estufas de S.Miguel.
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É provável que o leitor já se tenha perguntado porque é sempre tão impecavelmente tenra a carne apresentada pelos restaurantes chineses, para mais quase sempre bem passada? De facto eles abastecem-se de carne nos supermercados da zona, exactamente como todos nós.
O segredo é o uso de uma enzima natural, extraída do ananás, a bromelaína, que actua quebrando as cadeias proteicas, atenrando assim o bife mais duro.
É esta acção de cortar as extensas moléculas proteicas que faz com que frutos como o ananás fresco, o figo, o kiwi ou a papaia impeçam a gelatina de solidificar ou que se use embrulhar a carne em folhas de papaia nos continentes africano e asiático.
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Assim, se, como eu, gosta de comer sempre carne tenra e, como eu, não pode comer no dia-a-dia só carne do lombo de vitelas Mertolengas, Barrosãs ou do Yorkshire, pode sempre usar esse truque de química caseira inofensiva e eficaz que consiste em marinar a carne rija por umas horas em ananás fresco moído, depois lavá-la e cozinhá-la como quiser.
Se quiser ter ainda menos trabalho a bromelaína de ananás vende-se nos supermercados de produtos asiáticos e é só usá-la meia hora antes da confecção, como se de pimenta se tratasse.
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Ingredientes:
Metade de um ananás (claro que não-açoriano)
1 copo de vinho branco

Preparação:
Retire as folhas e o pé coriáceo ao ananás, parta em bocados com a casca e o talo central e passe no liquidificador com o copo de vinho.
Cubra a carne a atenrar com esta papa e deixe por 3 a 6 horas, de um dia para o outro em casos de dureza extrema.
Lave e cozinhe a carne.
... e agora que isto vai estando "de ananases", vou de férias, ficando o blog a descansar até 16 de Agosto.
Boas férias!!!

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Cabra Chanfanada em Branco

............................. Da carne de cabra, gosta-se ou não.
Já do gosto, diz-se que não se discute e também que é coisa educável e eu para aqui a pensar que raio de gosto será esse, que é e não é ao mesmo tempo. Claro que apesar de o nome ser o mesmo de duas coisas se há-de estar a falar e em campos forçosamente opostos e mutuamente vedados.
Se o gosto aprendido e pela educação aprimorado, permite a fruição racional da obra, oculta ao boçal e ao não-iniciado, é, por sua vez, incapaz de medrar o frémito, o arrepio emocional que arrebenta numa lágrima ou na alegria pura que não passou o crivo da comparação, da classificação, da análise. Agora estou a falar do “outro” gosto, que a todos tolhe e que também enobrece como o que de mais genuíno somos.
É assim com a carne de cabra, expoente máximo dos sabor e aroma de todos os ovinos e caprinos e que sendo mais atenuados nos animais jovens, cabrito e cordeiro, ganha toda a força e esplendor no animal adulto. Claro que aqui não há educação de paladar que valha: de cabra gosta-se mesmo ou odeia-se mesmo, não há assim-assims nem “como só um bocadinho”.
Do meu lado, do lado do cozinheiro, é uma refeição sem ansiedades nem dúvidas: aos primeiros fervores do tacho ou do forno logo se levantam narizes a farejar o antegozado petisco, outros torcem-se de horror e desaparecem como que enxotados por uma qualquer pestilência, coitados.
Está visto que este é um post só para alguns!
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Ingredientes:
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1 kg de Carne de cabra adulta
1 colher de sopa de banha
3 colheres de sopa de azeite
1 cebola grande
3 dentes de alho
Sal, pimenta, louro e noz moscada
Salsa fresca
1 colher de sopa de colorau
7,5dl de vinho branco
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Preparação:
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Arranje cabra adulta,que não é o mesmo que cabra velha, coisa que é relativamente fácil no Norte e bastante difícil no Sul. Na região de Lisboa, o Mercado de Benfica é uma boa opção pois fornece uma vasta clientela de origem africana, grandes consumidores de cabra. A cabra só se vende em quartos, perna e peito ou mão e peito; rende bem mais a primeira opção. Não deixe que lhe estralhacem a carne toda a cutelo, coisa a que eles estão muito habituados. Peça para darem só um golpe transversal nas costelas, dois na perna de modo a reservar a coxa,
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e, conforme o número maior ou menor de comensais, assim mandará partir o carré em pedaços ou reservá-lo inteiro para outro dia.
No meu caso, jantar para quatro, usei o peito e a aba e as carnes que desossei da parte do pernil e da anca (as partes à direita e à esquerda na peça da foto).
Ponha todos os ingredientes na panela de pressão e coza por uma hora, depois da pressão levantar. Abra e continue agora com panela aberta e lume forte até o caldo reduzir e ficar com o aspecto de molho tentador.
Sirva com batatas cozidas temperados com o molho da carne e uma salada a gosto (eu fui pelo pepino que está muito bom este ano).
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Nota: Eu gosto muito de chanfana, feita com todos os preceitos tradiconais, desde o forno de pão ao tinto bairradino e no barro preto de Molelos. Se chamei "chanfanada" a este prato não é porque ache que ele é uma chanfana mas porque, no palato, a comparação e a evocação são imediatas e inevitáveis. Mas claro que é outra coisa,muito boa também mas outra coisa; ficou "chanfanada" porque, como uma vez por aqui vos disse, é bem mais fácil fazer comida que baptizá-la!

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Salada de Búzios

............................ O estranho alien da imagem não é mais que um simples búzio da nossa costa, ser que tem, em vida, a abnegada missão de limpar os fundos marinhos, missão essa em que, convenhamos, se sai bem melhor que muitos humanos que mais não fazem que conspurcar esses mesmos fundos com toda a espécie de imundícies.
Autênticas caracoletas do mar, os búzios podem atingir mas de dois quilos com facilidade (estes tinham 2 kg, os três juntos)

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e devidamente cozidos em água do mar (30m) e temperados com um molho de vilão ou uma simples coentrada de azeite e vinagre, fazem uma salada com sabor a oceano,
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ideal para saborear sobre uma praia ou arriba, ao fim do dia, testemunhando cenas como esta que, apesar de eternamente repetidas nunca deixam de nos tocar.


quarta-feira, 7 de julho de 2010

Bolo de Tangerinas, by me

.............................. O bolo de tangerinas é uma criação da popular cozinheira/comunicadora britânica Nigella Lawson e tornou-se muito popular entre nós quando o seu programa Nigella Bites foi passado na nossa televisão, com uma boa meia dúzia de anos de atraso.
Apesar de Nigella Lawson não o citar, esta sua "criação" é uma réplica exacta de um bolo de laranja de inspiração oriental e que foi publicado pela primeira vez por Claudia Roden em 1968 no seu livro Middle Eastern Food, tendo a Nigella trocado laranja por tangerina e passado a chamar-lhe seu...! Obrigado Cláudia pelo esclarecimento; nunca é demais o seu a seu dono,(nota posterior à 1ª publicação).
Estando a nossa blogosfera entupida de réplicas do dito da Nigella, citada nuns casos, bem, e ignorada em muitos, como vai sendo, infelizmente, um hábito por aqui, seria redundante que fosse publicar mais um e claro que este bolo de tangerinas é antes uma variação que saiu muito bem.
A receita original usa amêndoa farinada fina que, na minha opinião, não acrescenta nada ao bolo, mal se sentindo no fim e desempenhando um papel de simples absorvente. Se se usar uma moagem mais granulada o resultado final é muito melhor mas a fase líquida fica exagerada e a cozedura (sem ajuda de um pouco de farinha) é difícil.
Decidi prescindir da amêndoa e usar em seu lugar tosta de pão ralada e substituí o fermento (cuja utilidade é discutível numa massa tão líquida) por metade das claras batidas em castelo.
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Ingredientes:
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4 Clementinas
6 Ovos
250g de Açúcar
200g de Pão Ralado (ou 150g de pão ralado + 50g de amêndoa moída grossa)
2 colheres de sopa de azeite ou manteiga
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Preparação:
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Coza as clementinas em água durante 2 horas.
. Escorra e passe-as no liquidificador até puré fino.
Junte 3 ovos e 3 gemas e os restantes ingredientes e misture bem até a massa ficar lisa. Envolva por fim nas restantes 3 claras, batidas em castelo firme com uma pitada de sal e leve a cozer em forma untada, a 175ºC, durante cerca de 45-55m.
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Deixe arrefecer na forma e sirva, de preferência no dia seguinte. (Não é bom ainda quente).

Nota: Se usar pão+amêndoa granulada há uma texturização final que é muito agradável. Se usar só pão a textura final é mais parecida com um pudim firme. No caso de usar noz em vez de amêndoa deverá suprimir a gordura da receita.

domingo, 4 de julho de 2010

Portobellos com Arroz

............................ Os melhores cogumelos recheados, faço-os no Outono com os grandes Agaricus ou Lactarius que crescem nos campos do Alentejo e que eu mesmo apanho. No resto do ano e particularmente no Verão em que gosto de refeições rápidas e leves, uso para esse fim qualquer outro cogumelo, desde que suficientemente grande, normalmente os chamados Portobellos.
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Este nome "Portobello" não corresponde a nada a nível científico, sendo antes uma designação comercial inventada pelo marketing para designar uma variante do velho Agaricus (vulgo champignon de Paris) com uma coloração acastanhada do chapéu e que, comercialmente, se deixa muitas vezes crescer e abrir, o que, infelizmente, é raro fazer-se com os "irmãos" de chapéu branco. Obtêm-se assim esplêndidos exemplares com mais de 10 cm de diâmetro de chapéu (às vezes 20cm!),
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com que se podem fazer belos cogumelos recheados sem correr o risco de ficarem com o aspecto de entradinha em copo-de-água de casório...
Podem-se rechear cogumelos com tudo que se quiser e for capaz de imaginar. Estes que hoje aqui vos trago foram recheados com uma sobra de arroz cozido e aparas de presunto culinário e, normalmente, não seria prato que aqui viesse ocupar post. Faço-o porque, ao dar uma volta ociosa pelo espaço virtual, apercebi-me que não há aqui uma única receita que respeite o modo de preparação de um cogumelo para grelhar, assar ou fritar: tudo começa por "lave muito bem..." a demonstrar bem a que ponto chegou a categoria da "cátedra" de quem, em face do fiasco culinário, mais se preocupa em exibir um pretenso grande êxito, que procurar saber o que correu mal (neste caso, porque cozeram os cogumelos em vez de assarem).
Chamo a atenção de quem seguir a receita, para a qual as quantidades e ingredientes até nem interessam nada, para os pormenores de execução e para as notas finais, razão de ser deste post.
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Preparação:
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Não lave os Portobellos. Pode raspar ao de leve a superfície do chapéu com uma faca ou com um esfregão verde, do centro para o bordo.
Retire o pé com uma torção e raspe as lâminas com uma colher de bordo fino, acentuando o côncavo.
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Salteie os pés e as lâminas, em manteiga, e junte presunto em pedaços.
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Junte um copo de arroz cozido e coentros, tempere agora (atenção ao sal do presunto)
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ligue o conjunto com um pouco de mozzarela ralado.
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Forre o interior do chapéu com uma camada fina de tosta ralada seca ou flocos de puré de batata,
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e encha com o preparado.
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Leve a forno muito quente durante 5 minutos, ponha-lhe por cima uma rodela de queijo de cabra
. e leve mais 1 minuto ao grill para fundir.
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Notas:
- A "carne" de um cogumelo é como um esponja microscópica. Se entrar em contacto com água, embebe e torna as fritura, o saltear ou o assar/grelhar impossíveis, pois a água presente ferve e coze o cogumelo que fica com a consistência emborrachada de um cogumelo de lata.
Para estas preparações é mandatório (sob pena de a fritura, o salteado ou o assado não acontecerem!) que o cogumelo seja limpo a seco. Nos casos em que têm uma película consistente, como os Lactarios, Morchelas, Suillus ou Porcinni pode-se destacar esta por inteiro, como uma pele que se esfola; nos outros casos passa-se apenas com esfregão seco ou lâmina de faca.
Na parte de baixo (lâminas), não se faz nada! Se estas estiverem sujas, retire-as e rejeite-as ou use os cogumelos para cozer ou guisar, lavando-os então.
- Ao fritar, saltear ou assar/grelhar um cogumelo, deve fazê-lo sempre com o calor ao máximo e por um curto espaço de tempo, pequenas quantidades de cada vez para que a temperatura não baixe e permita cozinhar o exterior do cogumelo mas sem que a temperatura interior chegue à ebulição, o que faria sair todos os saborosos sucos do próprio cogumelo.
- Ao fazer cogumelos recheados no forno para evitar que se forme algum líquido no interior do côncavo, o que sempre é inevitável que aconteça um pouco, por maior que seja a temperatura usada e a rapidez do processo, líquido esse que é muito desagradável a escorrer pelo prato, faça um "penso" preventivo de flocos de puré de batata, tosta ralada seca, couscous secos ou outro absorvente que lhe ocorra, de modo a que esse suco seja conservado e absorvido durante os minutos de processamento.
- Se for juntar cogumelos finais a um cozinhado onde existe um caldo ou molho aquoso, pincele-os previamente com azeite ou óleo, de modo a entupir os orifícios da "esponja" e permitir que se mantenham suculentos.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Bacalhau Sustentável

Textos e imagens da responsabilidade da Greenpeace Portugal
.......................... Svalbard - Noruega — A Greenpeace divulgou hoje novas imagens de criaturas únicas que habitam as profundezas do Oceano Árctico, obtidas com câmeras submersas de alta tecnologia. Estas imagens revelam criaturas de crescimento lento que sobrevivem neste ambiente inóspito coberto de gelo entre Outono e Primavera, como anémonas-do-mar, tunicatas e corais moles.
As alterações climáticas têm vindo a ameaçar cada vez mais a vida marinha que habita o Oceano Árctico. O aumento das temperaturas, as alterações das correntes e a acidificação dos oceanos estão a afectar este ecossistema pristino.
Simultaneamente, o recuar do gelo no pólo Norte tem permitido aos grandes arrastões aventurarem-se por territórios até hoje inexplorados.
Para proteger as criaturas que habitam as profundezas deste oceano, a Greenpeace está a pedir uma moratória internacional para todas as actividades industriais na pesca de arrasto.




Em Portugal o bacalhau, por vezes carinhosamente chamado de “fiel amigo” ou “pão dos mares” é um elemento importantíssimo na culinária tradicional portuguesa, representando mais de um terço de todo o pescado consumido em Portugal. Os portugueses são os maiores consumidores per capita a nível mundial, consumindo cerca de 60.000* toneladas de bacalhau por ano, 90% do qual é vendido salgado e seco.
* peso seco, correspondendo a cerca de 250.000t em fresco


.....................Bacalhau no Mar Báltico - © Greenpeace / Sari Tolvanen

Apesar da importância que damos ao bacalhau na nossa alimentação, poucas pessoas o conhecem enquanto peixe migrador que habita as águas gélidas do Norte do Atlântico e Pacífico.


Em geral o consumidor vê o bacalhau aberto e salgado ou congelado em filetes e dificilmente reconhecerá o peixe em vivo, apesar de também muito característico (o dorso esverdeado com pintas, a barriga prateada e uma linha lateral muito visível).
A informação sobre o estado dos stocks deste peixe raramente é passada ao consumidor, nem é divulgado que grande parte do bacalhau é capturado através da pesca de arrasto, uma técnica que destrói os habitats do fundo dos oceanos (como as colónias de corais e esponjas) e que captura acidentalmente outras espécies, como por exemplo o alabote da Gronelândia, os peixes vermelhos ou o bacalhau polar.

Perguntas frequentes
O bacalhau é uma espécie ameaçada?
Devo deixar de comer bacalhau?
O risco do desaparecimento comercial do bacalhau é real?
Como seleccionar o bacalhau?
Quais os métodos de pesca a evitar e quais os métodos de pesca recomendados?
Quais são as boas e más zonas para o bacalhau?
Posso consumir bacalhau do Mar de Barents?
Existem navios portugueses a pescar no Mar de Barents?
Mas se a pesca no Mar de Barents está regulamentada e fiscalizada, porque é que mesmo assim devemos ter cuidados?
Que devem os supermercados fazer?
Que mais posso fazer?

O bacalhau é uma espécie ameaçada?

O Bacalhau do Atlântico (Gadus morhua) está assinalado nas listas da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza) e OSPAR (Convenção para a Protecção do Ambiente Marinho do Nordeste Atlântico) como uma espécie vulnerável com estatuto de ameaçada.

Devo deixar de comer bacalhau?

Embora seja comercializado em Portugal bacalhau capturado através de métodos destrutivos ou de stocks em declínio, também existe bacalhau de origem sustentável que pode ser consumido sem constituir uma ameaça aos ecossistemas marinhos. Como consumidor deves seleccionar cuidadosamente o bacalhau que consomes e pedir aos retalhistas que vendam apenas bacalhau de origem sustentável.

O risco do desaparecimento comercial do bacalhau é real?
Por várias vezes na história da pesca do bacalhau houve colapsos de stocks devido à exploração excessiva, o que em algumas zonas acabou por levar ao seu desaparecimento.
O stock do Mar do Norte entrou várias vezes em colapso, a primeira vez já há 100 anos atrás, não tendo ainda recuperado. Em 1992 o governo canadiano foi forçado a encerrar a pesca do bacalhau na Terra Nova e em Labrador, lançando 40.000 pessoas para o desemprego e devastando centenas de comunidades costeiras.
Quase duas décadas depois, ainda não há sinais de que este stock alguma vez possa recuperar o suficiente para sustentar as economias locais. E mesmo o último dos grandes stocks de bacalhau do Atlântico, o chamado bacalhau do Nordeste Árctico (e o mais vendido cá, normalmente como 'bacalhau da Noruega'), já enfrentou situações de declínio alarmantes, obrigando as autoridades norueguesas a restringir a pesca na zona.

Como seleccionar o bacalhau?
Evita consumir bacalhau proveniente de zonas onde o stock esteja em mau estado, ou quando tenha sido capturado com métodos destrutivos (nomeadamente a pesca de arrasto de fundo) ou ainda sempre que não estiverem devidamente identificados a zona e método de captura. Dos 16 stocks comerciais de bacalhau do Atlântico, apenas os da Islândia, Mar de Barents (norte da Noruega) e do Báltico Este são considerados sustentáveis pelos cientistas.


Quais os métodos de pesca a evitar e quais os métodos de pesca recomendados?
A pesca de arrasto de fundo captura acidentalmente outras espécies que não são consumidas e que podem estar ameaçadas e destrói os habitats do fundo do mar. Escolhe bacalhau que tenha sido capturado com métodos tradicionais e não destrutivos como a pesca à linha ou o palangre artesanal.
Outros métodos mais suaves são o uso de redes de emalhar e o cerco demersal, desde que devidamente controlados por observadores independentes e aplicados com recurso a técnicas de mitigação da captura acidental.


Quais são as boas e más zonas para o bacalhau?
O bacalhau do Atlântico vendido em Portugal vem na sua maioria do Mar de Barents. O nosso país compra cerca de um terço do bacalhau exportado pela Noruega. Outras regiões de onde pode provir o bacalhau que compramos são a Islândia, a Rússia e ainda o Canadá.
A Greenpeace recomenda aos consumidores que evitem o bacalhau do Mar do Norte, Atântico Noroeste a Leste do Canadá, Kattegat, do Báltico Oeste ou de pescarias em que sejam capturados acidentalmente peixes vermelhos, bacalhau polar ou bacalhau costeiro da Noruega.
Os stocks de bacalhau do Oceano Pacífico estão em melhor estado, e desde que tenham sido capturados com métodos não destrutivos, são uma boa alternativa ao bacalhau do Atlântico – Na etiqueta deve vir a área de pesca FAO 67. No entanto, devemos evitar o bacalhau do Pacifico das águas do Canadá, pois o método predominante de pesca nesta zona ainda é o arrasto de fundo.


Posso consumir bacalhau do Mar de Barents?
O maior stock actual de bacalhau do Atlântico vive no Mar de Barents, a Norte da Noruega e da Russia. Este stock é considerado saudável e bem-gerido, mas se continuar a ser explorado intensivamente poderá entrar em declínio. O principal problema da pesca do bacalhau no Mar de Barents são os arrastões, que constituem cerca de 30 a 40% dos navios a operar nesta zona e que estão a destruir os habitats marinhos, incluindo as zonas de desova do bacalhau.
O stock do Mar de Barents é gerido pela Comissão Conjunta para a Pesca da Noruega e Rússia, que anualmente estabelece as quotas com base nas recomendações do ICES (Conselho Internacional para a Exploração do Mar – um conselho científico) e a pesca na zona é fiscalizada pela Noruega.
As quotas para 2010 rondam as 600.000 t para o bacalhau do NE Arctico e 240.000 t para arinca. Estas são as principais espécies pescadas no Mar de Barents.
Em geral podes consumir bacalhau do Mar de Barents sempre que existam garantias de que não foi capturado utilizando a pesca de arrasto de fundo.


Existem navios portugueses a pescar no Mar de Barents?
Actualmente estão autorizadas a pescar no Mar de Barents frotas da Noruega, Rússia, Portugal, Espanha, Gronelândia, Islândia, Ilhas Faroé, Reino Unido, Alemanha e França. Portugal tem 9 arrastões a operar no Mar de Barents, com uma quota de 4.730 toneladas que corresponde a cerca de 2% do total consumido em Portugal (peso vivo).


Mas se a pesca no Mar de Barents está regulamentada e fiscalizada, porque é que mesmo assim devemos ter cuidados?
Devido ao aquecimento das águas e mudanças das correntes o bacalhau está a deslocar-se mais para Norte em direcção ao Oceano Árctico, onde não existe qualquer mecanismo de gestão ou quotas de pesca. As alterações climáticas fizeram recuar a linha de gelo e tornaram possível a pesca nestas regiões anteriormente inacessíveis. Como os barcos que pescam no Oceano Árctico são arrastões, as consequências são imprevisíveis.
Mesmo mais a sul da linha de gelo, as frotas da UE e Rússia praticam principalmente a pesca de arrasto de fundo, enquanto na frota norueguesa 60% dos barcos ainda praticam a pesca tradicional.
A Noruega e a Rússia melhoraram muito o controlo da pesca no Mar de Barents e conseguiram reduzir drasticamente a pirataria, que durante décadas constituia um verdadeiro flagelo na zona. No entanto, muitos navios continuam a sub-reportar as suas capturas, incluindo as capturas acidentais rejeitadas, dificultando a gestão das quotas e resultando numa mortalidade de peixes superior à estimada.


Que devem os supermercados fazer?
Os supermercados são responsáveis pela comercialização de 70% do pescado que se vende em Portugal, o que lhes dá uma enorme capacidade de influenciar o mercado. Têm por isso a responsabilidade de garantir que não estão a incentivar a pesca em stocks ameaçados ou capturados com técnicas destrutivas para os ecossistemas marinhos. Devem ainda melhorar a informação disponibilizada ao consumidor, nomeadamente indicando para além da zona de pesca FAO, o stock e o método de captura.


Que mais posso fazer?
Como cidadão podes colaborar divulgando informação sobre o bacalhau junto dos teus contactos. Muitos dos ciberactivistas da Greenpeace utilizam as redes sociais, como por exemplo o Facebook ou o Twitter, ou os blogues para divulgar links e textos com informações para o consumidor.
Enquanto consumidor podes seguir os conselhos deste FAQ e seleccionar com critério o bacalhau que consomes.
Podes ainda pressionar os supermercados mais atrasados na implementação de políticas de compra e venda de pescado sustentáveis para que assumam a sua responsabilidade e vendam apenas pescado de origem sustentável. Também é importante que solicites aos supermercados informação sobre o stock e método de pesca se não estiverem assinalados nas etiquetas. Como consumidor tens direito a ser informado sobre o pescado que compras.