Se aos crentes são permitidos
tantos gozos através das verdades miraculosas, já aos que, como eu, são mais
incréus, resta-nos as viagens pelos “milagres” naturais, de entre os quais
avultam, pela sua maravilha sedutora, invisível e impalpável, a dos incríveis
odores de certas plantas.
De entre a infinita variedade de
mentas, o humilde poejo (mentha pulegium) é, para mim, a que talvez mais
incarna esse estatuto de aroma-milagre.
Esta planta de aroma ao mesmo
tempo suave e pungente, que nos habituámos a usar de tantas maneiras, nas
sopas, nos peixes, em infusões digestivas, no “chá de menta” do Norte de
África, tem ainda a particularidade de mudar o seu aroma conforme o estádio de
desenvolvimento em que é usada, fresca, seca, as folhas, as hastes floridas, só
as flores, cada um com o seu aroma e qualidades, todos magníficos.
O Alentejo é a terra do poejo e
foi lá, naturalmente, que nasceu o licor que leva o seu nome, sendo famoso o
que se fez durante muitos anos em Montemor-o-Novo. Hoje é uma sombra do que foi
e, francamente, nem merece menção a não ser pela glória passada, mas serve de
mote a este licor que aqui vos deixo e que recomendo, agora que o poejo está a
despontar, veemente, por esses campos fora, como que a pedir para ser apanhado.
Ingredientes:
Poejos frescos, bem verdes
Álcool* a (pelo menos) 90º
Açúcar
Água de Luso
Preparação:
Existem muitas maneiras de fazer
licores, em geral, e também licor de poejo, a começar pela grande divisão de
todos os licores, os que são feitos por destilação e os que são feitos por
infusão fria em álcool. Estando a destilação fora do âmbito caseiro, vamos
debruçar-nos sobre o licor de poejo feito por infusão alcoólica (alcoolato).
A maioria dos licores de poejo
são feitos com a planta seca, flores ou as hastes floridas completas, pelo que
podem ser infundidos em aguardente ou álcool a 60º, como todos os licores
feitos a partir de planta seca.
Neste caso, queria aprisionar
neste licor toda a fragrância do poejo fresco, juntamente com a clorofila para
que ficasse de um verde de esmeralda, o que implica cuidados especiais na sua
feitura, dada a sensibilidade da clorofila ao calor e à oxidação.
Para se conseguir um grau alcoólico
final aceitável para a conservação de licores feitos a partir de frescos,
deve-se empregar álcool com pelo menos 90º, melhor se se dispuser a 99º.
Pese as folhas de poejo fresco e
cubra-as com o dobro do peso de álcool a 90-99º.
Tape o frasco e deixe por três dias.
Ao fim deste tempo as folhas estão
descoradas e o álcool tomou uma cor verde profunda. O alcoolato está pronto.
Filtre.
Com um determinado peso de açúcar
e metade desse peso em Água de Luso, faça um ponto de pasta e deixe arrefecer
por completo.
Junte ao alcoolato filtrado o mesmo
volume de calda e volte a filtrar.
O resultado é este incrível licor
esmeraldino com sabor e aroma intensos de poejo fresco e que está pronto para
consumir três a quatro dias depois.
Dada a sensibilidade da
clorofila, mantenha este licor abrigado da luz.
Nota: * Trata-se, obrigatoriamente, de álcool de qualidade
alimentar, nunca álcool sanitário, que é tóxico. Se não dispuser de álcool
alimentar e quiser usar aguardentes ou vodka, terá de fazer o licor a partir de
poejo seco, que fica amarelo e a infusão deve ser feita, não por três dias mas
por três semanas.
Onde se pode adquirir alcool alimentar? O licor é espetacular e deve ser muito aromático. Parabéns pelo blogue. Também tenho um com objetivos um pouco diferentes mas na mesma área. Se quiser espreitar fica em: http//maeoqueeojantar. blogspot.pt
ResponderEliminarOlga Amaral
Não creio que tenha razão em relação ao que chama álcool sanitário. Há muitos anos, havia o chamado álcool desnaturado, que continha uma certa percentagem de metanol e que até era corado de azul, para se distinguir. Usava-se nas lamparinas, por exemplo na indispensável máquina de balão do café do meu pai.
ResponderEliminarO álcool que se vende nas farmácias e nos supermercados, a 96%, é etanol puro com um pouco de água destilada e não vejo porque possa ser considerado tóxico. É o que uso para licores.
Posso estar enganado e agradeço que me esclareça.
Olga Amaral,
ResponderEliminarO álcool alimentar vende-se em farmácias, sendo interdita pela lei portuguesa a venda fora destas. É, infelizmente, caríssimo, mas se conhecer alguém numa adega, é possível que lhe possa arranjar uma pequena quantidade de álcool vínico, usado para fazer os vinhos generosos, abafados, etc.
J.Vasconcelos Costa,
Está de facto enganado. O álcool sanitário vulgar, a 96%vol., é na verdade álcool desnaturado, não com metanol e corante azul como o destinado a queima, mas com 0,25% de cetrimida que é um derivado do amónio quaternário, anti-séptico externo muito conhecido pelo nome comercial de "Cetavlon" e que dá ao álcool assim desnaturado um amargo pronunciado, propriedades nauseantes e eméticas se ingerido, tornando-o impróprio para bebidas alcoólicas e portanto muito mais barato pois não paga a taxa dos alcoóis.
Foi o que motivou a enorme baixa do preço do álcool sanitário, que há alguns anos chegou a preços proibitivos, antes de passar a ser desnaturado.
Se for ou conhecer alguém que passe por Andorra, os garrafões de álcool alimentar, de 5l, custam lá 7€ e 9€, a 90º e 99º, respectivamente.
http://www.dre.pt/cgi/dr1s.exe?t=dr&cap=1-1200&doc=19983493%20&v02=&v01=2&v03=1900-01-01&v04=3000-12-21&v05=&v06=&v07=&v08=&v09=&v10=&v11=Portaria&v12=&v13=&v14=&v15=&sort=0&submit=Pesquisar