quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Cozer Massa ou "barretes de chef"

Contagiadas pelos delírios organizativos e empresariais norte-americanos, a partir de meados de 80 e com toda a força nos 90, as empresas portuguesas aspirantes a modernaças, passaram a ser "exércitos" sui generis de coronéis e generais: toda a minha gente era chefe de qualquer coisa...

Por essa altura surgiram, à luz da ribalta mediática, os chefs!

Primeiro timidamente, depois como cogumelos, acompanharam, pela viragem do milénio, a passagem da cozinha como arte e saber para a cozinha espectáculo em que o que contava, claro, muito mais que saber cozinhar era saber comunicar e divertir.
Foi a altura em que qualquer apresentador medíocre de televisão, ou humorista, ou dono de restaurante da Caparica passou a “especialista” em doces, receitas, programas de culinária, o livrinho certo nos escaparates… depois surgiram também os chefs “estrela-sexy”: jovens, lindos, louros, exóticos, de turbante, a fazer arregalar o olho do mulherio farto de chefes "Silva", feios, gordos e velhos.
A coisa foi tão vivida e excitante que ninguém se lembrou de perguntar: mas “chefe” de quê ou de quem? Inventou o quê? Criou que prato? Cozinhou onde? Será que sabe salvar mesmo uma mayonnaise talhada? Ou usa Hellman’s?!
E como o showbizz é impiedoso e sôfrego de constante novidade, quanto mais espaventosa melhor, lá foram “criando” as maiores aberrações que a maltinha ignara papava como bíblicos mandamentos, que isto na televisão não dá para ouvir se alguém diz “o rei vai nú”, ainda bem…

Aqui cabe uma pausa para que fique registado que eu acho que não são todos assim: Há magníficas excepções, gente nova a cozinhar e inovar divinamente, gente que está realmente na cozinha a fazer mais que cortar salsa a ritmo AK47*, para papalvo extasiar, ou a "empratar" com muitos riscos e gotinhas pelo prato fora.

Quem não experimenta, quem não questiona a tradição, também não avança.
Os nossos chefes andavam ocupados demais a descobrir umas ervas daninhas para nos impingir como salada “selvática” para perderem tempo a verificar as “regras” da cozedura das massas. Aquilo que era irrisório e que, para mais, toda a gente dizia, estava certo de certeza, não era? A massa coze-se em muita água a ferver em cachão, panela destapada, na razão de um litro para cada 100 gramas! Dizia a mamma, dizia o livro, dizia o chef!
Vitória da democracia: A Verdade é o que a maioria diz que é verdade.

Se a cada semana, um milhão de famílias portuguesas cozinhar 500g de massa desta maneira, gastará no processo 5 milhões de litros de água, mais do que a água de 3 piscinas olímpicas**. Por semana!

No mundo a morrer à sede de água potável, que desperdício de água e de energia! Que inutilidade!

A massa não tem de cozer em muita água!
A massa não tem de cozer a ferver em cachão!
A massa não tem de cozer em panela destapada!


Um litro e meio de água chega e sobeja para cozer 500g de massa, em panela tapada e lume no mínimo.
Depois é tudo igual, a massa não pegou nem colou, cozeu na perfeição e poupou ….. duas grandes piscinas olímpicas.

Nota:
*AK47 lendária espingarda-metralhadora russa, a Kalashnikov, famosa pela sua rápida cadência de tiro, muito igual ao ritmo matraqueante de corta-legumes de alguns dos nossos chefs mais circenses, ou talvez em despique com a Bimby?!
** Piscina Olímpica: 50x22m – 1650m3

7 comentários:

  1. Só o Luís para me fazer rir com coisas tão sérias...
    As minhas massas nunca ficaram mal (coladas ou peganhentas) nem nunca aspiraram a cozer em piscinas olímpicas ou outras!
    Agora vou confessar uma coisa: tenho 1 barrete de chefe, igualzinho aos da foto, dado pela minha amigona Maria José... mas não uso, fiquem descansados. Foi só uma maneira que a Zézinha arranjou de me dar miminhos sem palavras.
    Beijinhos.

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  2. Adoro vir aqui... Uma lufada de ar fresco da maioria dos blogues de culinária, e onde podemos sempre aprender muito.
    Realmente sempre me fez muita confusão ouvir esses mitos acerca de cozer massa. Nunca os utilizei, e nunca deixer de ter à minha mesa uma massa deliciosa e bem cozida. Igualmente com o mito da quantidade da água, vem aquele que diz que é necessário um fio de óleo ou azeite para esta não colar.
    E por falar em aproveitamento de recursos.. .Ainda hoje a minha empregada me contava que coze a lata de leite condensado (depois de o papel tirado e devidamente lavada) juntamente com os legumes para a sopa. Depois tira a lata, tritura os legumes e já está!
    Só mais uma coisa! Fiz a sua versão de bife à cervejaria (Trindade. Delicioso. Obrigada pela receita!

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  3. Eu tb levava estes princípios tão enraizados ao pé da letra, até que conheci o Spaghetti All’Ubriaco, em que a massa coze em vinho tinto.
    Ao pesquisar para fazer a receita, percebi exactamente o que diz: que se pode cozer numa proporção de líquido muito mais reduzida, com a tampa colocada e lume baixo.

    Adorei a referência ao turbante... :)

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  4. UFA!!! estou muito mais descansada.
    é que eu considerava-me uma aldrabona na cozinha por confeccionar a massa em pouca água... mas como o resultado final era sempre bom nem pensava mais no assunto.
    já vejo que não estava tão errada como pensava.
    obrigado por mais uma grande lição - de culinária e de vida!

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  5. Nisso eu fujo à regra, nunca cozi a massa em litros de água, nunca destapei a panela completamente, fica só uma frincha para a água não vazar e quase sempre é cozida em lume brando. E também não sou das que gosta de a comer al dente, ou está cozida ou não está... não gosto de bocados de massa agarrados ao marfim depois de os mastigar he he

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  6. É daqueles mitos que acho que não passam mesmo de mitos, todos o sabem, todos o dizem, mas ninguém o faz, lol

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