Trazida
para o ambiente alentejano por “galegos”, “ratinhos” e outras maltas que
chegavam das Beiras e mais a Norte para os trabalhos agrícolas sazonais do
montado e das searas, a papada é um vestígio do unto, gordura temperada, ensacada
e fumada que era usada nas cozinhas populares beirãs e transmontanas.
Hoje virtualmente extinta, feita aqui e ali como curiosidade
histórica, a papada fumada foi muitas vezes conduto e petisco de taberna de
ranchos de tal forma pobres que tinham de recorrer às partes menos nobres do
porco, neste caso a manta de toucinho que corresponde ao pescoço do porco,
muitas vezes ensanguentado, trazendo agarrada parte da glândula parótida e hoje usada para extracção de banha e fabrico de torresmos pela comunidade africana e
pouco mais.
Não tendo acesso às possibilidades de uma cozinha ou a tripa
nas casas em que ficavam durante a sua estadia nas herdades, esta peça
entremeada e rejeitada era conservada por meios básicos, uma salga ligeira,
tempero com a massa de pimentão e uma fumagem sobre as brasas onde se aqueciam
à noite, às vezes ensacando a papada numa meia, para melhor a dependurar ao
fumo.
O certo é que as papadas fumadas se tornaram populares não
só entre migrantes mas também entre ganhões e o caso não é para menos dada a
excelência de sabores obtidos de uma preparação que, como tantas provenientes
do Alentejo pobre, se consegue com quase nada.
Se não souber onde encontrar à venda uma papada fumada,
tarefa quase impossível no comércio de fumeiros, poderá sempre fazê-la, aliando
ao prazer do petisco em si, um outro que vem da descoberta de gestos perdidos
há muito e que dá outra dimensão à serena degustação de umas finas fatias de
papada.
Ingredientes:
Papada de porco
Sal
Massa de pimentão
Preparação:
A aquisição da papada propriamente dita pode não ser fácil
em ambiente citadino mas poderá sempre encomendar no seu talho que a mandará
vir para si ou então comprá-la nos mercados mais periféricos, que abastecem as
franjas mais pobres da população que vivem em cinturas urbanas.
Parece uma tira de toucinho entremeado com bastante gordura
e restos de uma víscera que é a glândula salivar e que deverá deixar.
Lave, retire o courato e apare.
Corte no sentido do comprimento,
de modo a fazer duas tiras
e a expor a camada interna de músculo que, de outro modo, dificilmente poderia
secar e salgar.
Faça um lume de carvão e ponha madeira de azinho seca sobre
as brasas de modo a que se consuma devagar. A papada deverá estar por cima pelo
menos a um metro de distância de modo a que seja fumigada mas não apanhe calor.
A fumagem deve durar dois ou três dias, após o que a papada
está pronta sendo apenas necessário que seque o tempo necessário a que adquira
a consistência de um toucinho fumado, o que demora entre duas a três semanas
conforme a humidade do ar.
A carne da papada, atravessada por inúmeros veios de gordura,
tem um sabor único e é ainda melhor fatiada muito fina, ficando a raiar o
divino se grelhada ou frita como o bacon.
Boa tarde.
ResponderEliminarAntes de mais muito obrigado pelo sue Blog. Tenho aprendido muito e tenho aprendido aquilo que nunca na minha vida pensei vir a aprender. Por tudo isso mais uma vez os meus agradecimentos.
Nas passando agora à pratica tenho de lhe solicitar alguns conselhos.
Vi e li o seu post acerca de fazer chouriços. Já temperei a carne de porco, que agora está a aboborar no frigorifico.
Agora põe-se o passo seguinte, depois de enchera a tripa.
Pensei por os chouriço no forno, 80ºC até internamente atingirem os almejados 71ºC.
Depois dar-lhes fumo para cima. Tenho um kamado, e já consigo gerar fumo a frio. Não de azinho mas das especies de que os américas fazem pellets.
Cheira-lhe a quê? O que me aconselha a fazer? o meu objetivo é fazer uns chouriços (lateralmente poder dizer que já enchi chouriços, coisa de que poucos portugueses se podem, com propriedade, gabar).
Mais uma vez muito obrigado pela sua disponibilidade
Vasco Orey
Caro Vasco Orey,
ResponderEliminarMuito obrigado pelas suas palavras amáveis.
Em relação aos chouriços, não faço nenhuma ideia do que sejam essas temperaturas de que me fala. A 80ºC ou mesmo a 71ºC os chouriços ficam cozidos. O fumeiro deve ser rigorosamente a frio, razão porque os fumados têm de ficar longe da fonte de fumo e calor. Mesmo a secagem, se optar por fazê-la, deve ser feita em temperatura morna (max.50ºC) e com a porta do forno aberta.
Não percebi exactamente o que me diz de pellets, mas nunca deverá utilizá-los para defumar a menos que sejam feitos com esse fim, já que os pellets em Portugal são produzidos com resinosas e aglomerados com cola e desgraçam qualquer fumeiro. Azinho, sobro, oliveira, laranjeira (por esta ordem) são as melhores madeiras para fumar.
Veja o que digo aqui: https://outrascomidas.blogspot.pt/2012/12/fazer-chouricos-e-defuma-los-em-lisboa.html
Bons chouriços!
Luís Pontes
Já tinha saudades de mais uma das suas deliciosas receitas e da forma apaixonada como as descreve, mostra uma dedicação enorme a nossa culinária... Obrigada por as partilhar
ResponderEliminarElsa Novais
É sempre muito bom saber que o Luís Pontes ainda vai colocando estes preciosos post para todos nós...
ResponderEliminarBem haja
antónio castro
Por favor tiene el blog opción de traducir?, me encantaría poder hacer sus recetas. Gracias por compartir. Un saludo
ResponderEliminarBoa noite,
ResponderEliminarNão percebi se vai fumar com ou sem a pelicula, a segunda duvida é se se passa a carne por agua para retirar o sal ou se sacode.
Obrigado