domingo, 28 de fevereiro de 2010

Bife à Marrare

.............................. Há quem diga que era galego, outros, que seria napolitano e cozinheiro. O certo é que António Marrare veio para Lisboa nos finais do século XVIII, onde se tornou pessoa de grande requinte e dono de vários cafés na capital. Além de um primeiro, situado junto ao S. Carlos, abriu outros três que se transformaram em pontos de reunião da melhor sociedade lisboeta– no Cais do Sodré, no Chiado (conhecido como o “Marrare do Polimento”) e na Rua dos Sapateiros. Foi neste último, fundado em 1804 e também chamado Marrare das Sete Portas, que nasceu o célebre bife lisboeta que tomou o seu nome.
O serviço, exemplar, era feito em recipientes e talheres de prata legítima e, para que o bife pudesse ser ali mais bem apreciado, era o único local em Lisboa, de restauração, em que era proibido fumar.
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O Bife à Marrare é um hino à simplicidade e ao bom-gosto, tendo servido de pauta a todos os bifes "à café" que depois dele surgiram, sempre com adições, hoje a mostarda, amanhã o alho, depois sei lá o quê mais, na tentativa de melhorar aquilo que já era absoluto.
Poucos foram os que souberam ter a humildade de não se atreverem a alterar a obra-prima, minimal, de António Marrare e hoje é difícil encontrar em Lisboa onde comê-lo na pureza da receita original, há o do Café de S. Bento (infelizmente €€€€€) e pouco mais.
Mas é fácil fazer esta maravilha em nossa casa; segredo, apenas o de respeitar escrupulosamente a receita original e que nunca foi escondida, ao contrário de tantos outros "segredos".
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Ingredientes:
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2 bifes altos de vaca, do pojadouro (2x200g)
125g de Manteiga
100ml de Natas
Sal e pimenta preta
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Preparação:
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A receita original usa bifes altos do pojadouro. Neste caso, porque se trata de um prato em que o sabor da carne é rei, utilizei dois bifes da vazia de Carne Barrosã DOP, que cumpriram na perfeição o desiderato.
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Numa frigideira de ferro ou, na sua falta, de fundo bem espesso, derreta metade da manteiga. Quando estiver bem quente, introduza os bifes e deixe-os alourar de um dos lados. Vire-os sem os picar e aloure-os do outro lado, sempre em lume forte mas sem deixar mazelas queimadas.
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Escorra a manteiga em que o bife fritou, deixando os bifes na frigideira e regeite-a. Junte então a restante manteiga,
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tempere os bifes com sal marinho grosso e pimenta preta moída na altura.
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Reduza a chama e deixe cozer o bife durante uns minutos, dos dois lados, agitando a frigideira. Adicione as natas por fim e deixe engrossar o molho, continuando a agitar a frigideira.
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Coloque os bifes em pratos aquecidos e regue-os com o molho. Sirva acompanhados com batatas fritas em azeite, em palitos grossos e compridos, dentro de um prato e embrulhadas num guardanapo de tecido branco.




Nota:

A Carne Barrosã DOP, quer na vitela, quer no novilho, a minha preferida, é uma carne do extremo Norte de Portugal que além de uma tenrura excepcional, apresenta um sabor realmente marcado e ideal para pratos que não utilizam muitos tempêros e em que, portanto, se pretende realçar a sabor da própria carne.

Felizmente está agora mais acessível em muitas superfícies de Lisboa, onde, até há algum tempo, era difícil de arranjar. O preço é cerca de 4-5€ mais cara que a carne de novilho nacional, mais indiferenciado, mas nestes casos vale bem a pena este pequeno investimento.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Pão com Azeitonas Pingo Doce (Muita Parra, Pouca Uva)

............................... Foi anunciado com espavento e até era uma boa idéia: depois de pão com tudo o mais, aparecia finalmente o portuguesíssimo Pão com Azeitonas!
A ideia foi do Pingo Doce e o facto é que os portugueses, como era de esperar, aderiram de imediato a tão cativante novidade; foi vulgar que nas secções de padaria deste supermercado, cada nova remessa se esgotasse em pouco tempo.
Gostei da perspectiva e, claro, assim que o vi, comprei-o!
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27 cêntimos foi quanto custou a desilusão! A montanha pariu um rato.
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É espantoso como uma tacanhez merceeira, uma esperteza saloia de vistas curtas, pode deitar a perder um produto que tinha tudo a seu favor para singrar. Uma massa excelente com aroma e sabor antigos a bom azeite, crosta equilibrada e estaladiça, aspecto atraente, boas azeitonas de cura natural mas....... alguém quis, à boa maneira portuguezinha, poupar.
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Poupou-se nas azeitonas!
Sim, a Jerónimo Martins ou, mais provavelmente algum subalterno a querer mostrar como era esperto, decidiu cortar nas azeitonas do pão com azeitonas! Ou, mais exactamente, do pão sem azeitonas.
Cada pãozinho apresenta cinco ou seis pedacinhos de azeitona, no exterior, para se ver, para enganar! Por dentro, nada! ou antes, pão, bom pão.
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Pouparam 2 ou 3 cêntimos em azeitona.
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Por mim, comi os pãezinhos "com" azeitonas do Pingo Doce a acompanhar as minhas boas azeitonas alentejanas e caseiras e souberam-me divinamente.
Nota:
Senhores da Jerónimo Martins, glosando a vossa publicidade, é claro que não é bem por isto que o Pingo doce é ....... o Pingo Doce, pois não?
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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Ervilhas com Ovos

................................... Não há quem não as saiba fazer, saem sempre bem, é uma daquelas comidas que ficam feitas mais depressa que fast food e até tem um saborzinho caseiro e reconfortante que o tornou, desde sempre, num dos meus repastos preferidos.
A excelência de umas Ervilhas com Ovos, como a excelência de qualquer prato, do mais simples ao mais elaborado, atinge-se através de um conjunto de ingredientes aliados a uma execução cuidada: ervilhas frescas, ovos fresquíssimos e "do campo", bom bacon e chouriço artesanal, azeite irrepreensível.
Claro está que, durante 9 meses em cada ano, temos de prescindir de um ou mais destes ingredientes, nomeadamente as ervilhas frescas que, felizmente, ainda não há vindas de avião de uma horta qualquer do hemisféro Sul, e temos de fazer o melhor possível, e não é pouco, com as congeladas ou em lata.
Excelentes ervilhas com ovos são também ovos no ponto perfeito.
Conseguir que os ovos fiquem no exacto ponto de cozedura, a clara totalmente coagulada e a gema totalmente cremosa mas não líquida, exige um conhecimento profundo do tacho, do lume do nosso fogão e do modo subtil como se dão as trocas de calor no interior do nosso cozinhado. Este resultado é impossível com ovos colocados na periferia do tacho, encostados à sua parede, uma prática muito comum. Adiante ficará uma técnica de colocação não-periférica dos ovos que se revela muito simples e satisfatória.
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Ingredientes ( 3 pessoas):
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6 ovos
800g de ervilhas
0,5dl de azeite virgem extra
1 chouriço de carne caseiro
250g de bacon magro
1 cebola pequena
2 dentes de alho
1 folha de louro
2 colheres de sopa de polpa de tomate
1 malagueta
Sal e pimenta preta
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Preparação:
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Refogue no azeite todos os ingredientes, excepto ervilhas e ovos.
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Junte as ervilhas e água suficiente para que o nível de líquido fique ligeiramente abaixo do nível das ervilhas, envolva, tape e deixe ferver em lume baixo durante 15-10 ou 3 minutos, consoante estiver a usar ervilhas frescas, congeladas ou de lata.
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Variações são possíveis no tempo de cozedura das ervilhas cruas, pelo que deverá verificar que estão efectivamente cozidas.
Se não tem prática de abrir ovos com precisão com uma só mão, abra-os previamente para um pequeno recipiente como um pires ou uma chávena de café e mantenha-os à mão.
Introduza então duas colheres de pau juntas, com os côncavos virados para dentro, verticalmente nas ervilhas, no sítio onde quer depositar o ovo,
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abra então as colheres deixando que se forme um espaço sem ervilhas entre elas e
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com a mão direita deite o ovo neste espaço.
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Faça isto aos seis ovos, sem grandes demoras pois o tempo está a contar, tape e deixe o lume baixo para que não haja turbulência.
Após retomar a fervura, conte 6 minutos para ovos à temperatura ambiente ou 8 minutos para ovos que tenham vindo do frigorífico, apague o lume, deixe tapado por mais 3 minutos, no Inverno, destapado no Verão.
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e sirva logo para o prato.
Conforme o comportamento térmico do tacho (não use barro, a menos que goste de ovos recozidos) e a potência do lume, estes tempos podem variar sensvelmente pelo que terá de verificar quais são os tempos certos para o seu ovo escalfado perfeito. Também há variações entre as estações frias e quentes, mas o aspecto de um ovo de sabor e cremosidade sublimes é assim:

Bom apetite!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Omoleta de Espargos Bravos

................................ O Espargo Selvagem, Asparagus albus, é uma liliácea (quem diria!), espinhosa e que cresce em lugares secos, pedregosos e expostos ao Sol.
É também o pai de todos os espargos domesticados, que lhe herdaram a forma e tenrura mas não, infelizmente, o sabor intenso e único. O que se come de um espargo selvagem é o rebento novo, quando não ultrapassa 20cm e que tem uma espessura que não excede a de um lápis.
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Começaram cedo, este ano, a aparecer os espargos!
Este é o fruto mais apetecido, uma delikatessen improvável a brotar das pedras secas alentejanas onde crescem as minhas oliveiras e cuja primeira colheita, ainda tímida, deu origem a uma soberba omoleta que aqui vos deixo.
Devo realçar que esta técnica não é usada no Alentejo, não faz qualquer cozimento prévio do espargo, o que lhe mantém uma textura estaladiça e claramente melhor que a obtida pelas receitas tradicionais. Isto é uma achega àqueles que me acham um repositório de tradições: as tradições, com todo o peso de experimentação e aprendizagem que transportam, são mananciais de saber, mas não são cânones nem intocáveis. Respeitem-se quando, e só quando, são a melhor solução.
Não é este o caso da tradição na Omoleta de Espargos Bravos!
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Ingredientes:
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Espargos selvagens
Sal e Pimenta preta
Ovos
Azeite Virgem
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Preparação:
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O espargo é constituído por uma cabeça e um corpo mais ou menos longo.
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Tradicionalmente só se aproveitam as cabeças, 4-5 cm a partir da ponta, o que é um erro crasso.
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O que determina qual a parte utilizável do espargo é a fibra exterior do caule: enquanto o caule partir quando é dobrado é utilizável e excelente; a partir do momento em que começa a dobrar sem partir é que deve ser rejeitado.
Corte as cabeças dos espargos , reserve-as, depois os caules em trocinhos pequenos de menos de 1cm.
Salteie em azeite, com um pouco de sal e pimenta, as cabeças de espargo, durante cerca de 30segundos em lume forte, retire-as e reserve-as.
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Salteie agora, no mesmo azeite, os restantes trocinhos e reserve-os também.
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Bata os ovos com sal e pimenta preta, não ponha salsa ou coentros que, neste caso, contaminariam o delicado sabor dos espargos, e faça uma omoleta enrolada em 3-4 fases:
Ponha na frigideira uma primeira porção de ovo e enrole. Deite então uma segunda e depois uma terceira porções de ovo batido, sobre as quais divide os trocinhos de espargo salteados. Enrole.
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Ponha por fim o resto do ovo batido e disponha as cabeças de modo regular, a gosto, tendo em conta que será esta última folha que determinará o aspecto final da omoleta.
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Enrole até ao fim e deixe alourar dos dois lados.
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Sirva quente com batatas fritas em azeite refinado e salada a gosto.
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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Cozido (pequeno) de Pernil Fumado

.............................. Foi há já algum tempo que o Cupido publicou um cozido de pernil fumado que não deixou de me "atormentar" desde então.
Finalmente, apareceu-me um belo exemplar de pernil fumado e não o deixei escapar. Como sou, evidentemente, mais glutão que o Cupido, acrescentei uns toques de enchido à frugalidade original e o jantar acabou por ficar mais rico que o inicialmente planeado, mas, ainda assim, muito, muito bom!
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Ingredientes (3 pessoas):
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1 Pernil fumado
1 Couve Coração
3 Batatas
3 Nabos
3 Cenouras
- e, facultativos:
1 Chouriço de Carne
1 Farinheira
1 Chouriço de Sangue (negrinho)
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Preparação:
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Dê uns golpes no courato do pernil e ponha de molho de um dia para o outro.
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.Coza o pernil demolhado em água e sal, com o chouriço de carne, durante 45m na panela de pressão. Abra e junte as cenouras e nabos. Deixe ferver 8 minutos e junte as batatas, a couve cortada em quartos e, por cima, o chouriço de sangue e a farinheira, picados com um palito.
Coze mais 12-15 minutos, conforme o tamanho da batata.
Serve-se bem quente e dá um belo caldo fumado.
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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Petingas de Escabeche

.......................... Os escabeches fazem parte de um grupo de conservas caseiras de peixe, aprendidas pela experiência e pela necessidade, ao longo de séculos de convívio com períodos de abundância e outros de escassez em que só a conservação evitava dias de fome.
Estão neste caso pratos emblemáticos da nossa cozinha popular (e há outra?), como os Charrinhos Alimados do Algarve ou as Trutas Abafadas em Azeite e Vinagre, no Norte.
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Numa época em que é cada vez mais difícl planear refeições que devam ser preparadas com dois ou três dias de antecedência, em que tudo se resolve sobre a hora, quantas vezes à custa dessa nova lógica que se chama take away, lógica insidiosa e pérfida que parece resolver problemas de uma vida apressada mas que realmente apaga registos e deixa atrás de cada nova refeição "tradicional" devidamente normalizada, um deserto cada vez mais árido de esquecimento.
Cada vez mais, comemos o que alguém que não conhecemos nos prepara e esquecemos o que os nossos pais e avós comiam.

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Eu sou dos que ainda vão à praça
. e que, se aparecem umas petingas, mesmo das magras de Fevereiro, penso logo em escabeche e que daí a dois ou três dias estarão uma delícia daquelas que já eram velhas quando os meus bisavós eram novos, um daqueles sabores que nos fazem sentir ligados e pertença de uma cultura.
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Ingredientes:
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Petingas (ou sardinhas, ou outro peixe miúdo)
Cebolas
Alhos
Azeite
Vinagre
Sal e Pimenta e Louro
Batatas
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Preparação:
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Arranje as petingas tirando-lhes as cabeças e vísceras.
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Tempere-as com sal e frite-as em azeite, sem enfarinhar, até estarem bem fritas.
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Disponha-as num prato fundo.
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No azeite que serviu para fritar as petingas, refogue sem deixar chegar a alourar, a cebola, os alhos e a folha de louro.
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Tempere este refogado leve com sal e pimenta, junte uma quantidade generosa de bom vinagre de vinho (tanto de azeite como de vinagre) e regue as petingas com esta mistura. Deixe em sítio fresco (no Verão, no frigorífico) de 1 a 3 dias,
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e sirva com batatas cozidas que se temperam com o molho do escabeche.
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Pataniscas de Bacalhau (preceitos da Bica e Madragoa)


......................... A minha avó paterna, de seu nome Amélia, nasceu na Rua da Hera, à Calçada do Combro e viveu depois, toda a sua vida, um pouco adiante, na Rua da Bica, o elevador a passar a menos de um metro da porta.
Já a materna, a Avó Estefânia, nasceu e viveu na Travessa do Pasteleiro, no coração da Madragoa.
Ambas eram exímias executantes de Pataniscas de Bacalhau!
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Não se pense, no entanto, que eram parecidas as pataniscas das avós; antigamente a vida era mesmo diferente entre bairros populares (para mais rivais), até no modo de fazer pataniscas.
As da Bica eram gordas e fôfas como sonhos, apenas o travo da salsa competia com o sabor do bacalhau; já as da Madragoa, mais delgadas, exibiam uma paleta de sabores variados, dentada a dentada, conforme se apanhava cebola, alho, bacalhau, mas nenhuma tinha qualquer ligação a essas pataniscas de café ou restaurante modernaços, a darem-se ares culturais de preservadores da patanisca-em-perigo-de-extinção e que apresentam para o efeito uns incríveis polmes gordurosos fritos em óleo cansado, uns abortos aborrachados de impossível digestão, acompanhados de Arroz de Feijão agora inventado como "acompanhamento tradicional da patanisca", como essas Casas de Fado pinocas onde se debita a turistas enlevados doses maciças de "Amália Hoje" e enormidades do género Tudo a Ver Com Showbizz Nada a Ver Com Lisboa.
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Há comidas que são como o Fado Vadio: esquivas e fugidias, não se deixam aprisionar por receitas nem render aos ditames do espectáculo, decorra ele num teatro ou numa qualquer cozinha de "autor". São os Peixinhos da Horta, umas Petingas de Escabeche, o quase extinto Fado Vadio* e, claro, as Pataniscas de Bacalhau, ex-libris das velhas tascas e cozinhas populares da cidade de Lisboa.
Pessoalmente, as minhas preferidas são as da Bica e da Avó Amélia, talvez porque foram também as da minha infância e porque se coadunam mais com o meu gosto por sabores simples, em geral.
Hoje, no entanto, fiz as duas para que ficassem aqui registados os preceitos que, esses sim, estão em risco de se perderem e, como se lê aqui ao lado no selo da Greenpeace, Extinction is Forever! .
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Ingredientes:
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1 posta de bacalhau
300g de farinha com fermento (ou sem + bicarbonato)
2 ovos
Sal e pimenta
Salsa picada
Azeite refinado para a fritura
+
1 cebola e 3 alhos, só na variante espalmada, da Madragoa
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Preparação:
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Dê uma fervura à posta de bacalhau ou aos restos já cozidos. Reserve a água.
Desfie o bacalhau ainda morno, à mão, tendo o cuidado de o deixar em pedaços pequenos (e não em fios, como para souflée ou pastéis de bacalhau). Reserve.
Numa tigela misture e bata muito bem os ovos, água de escaldar o bacalhau, farinha, sal e pimenta,
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doseando a água de modo a obter uma consistência em que, após parar de bater, dentro de poucos segundos, começam a aparecer umas bolhas do tamanho de ervilhas à superfície do polme e que demoram 2 ou 3 segundos até rebentarem.
Este aparente preciosismo é, na verdade, a chave para o tão difícil sucesso das pataniscas.
O polme deve ficar muito menos líquido que o para crepes, mas, ao deitar na frigideira deve escorrer francamente da colher, sem qualquer tipo de ajuda.
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Comece por fazê-lo mais para o grosso, esperimente fritar uma patanisca para ver o resultado, acrescente mais um cálice de água, experimente outra vez, etc. até perceber que atingiu a consistência perfeita.
Quando o polme estiver muito bem batido, (use colher de pau, não batedeira, que faz bolhas muito pequenas), junte os pedaços de bacalhau, a salsa picada grosso, prove e rectifique sal e pimenta. e deixe ficar em repouso, pelo menos uma hora.
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Na versão espalmada, junte agora a cebola e o alho, muito bem picados.
Se se atrasou e não tem essa hora, acontece, junte uma colher de sopa de sumo de limão ao polme, para activar a produção de bolhas pelo fermento químico da farinha (bicarbonato).
Fritam-se numa frigideira alta com abundante azeite bem quente,
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ou em frigideira larga com pouco azeite, na versão Madragoa,
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deixam-se cozer bem
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e põe-se a escorrer em papel absorvente.
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Bica e Madragoa, juntas na mesma mesa!
Tradicionalmente, a patanisca é servida como petisco, acompanhada de cerveja ou vinho, ou, como refeição, com arroz de tomate
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ou de grêlos e saladas de alface ou tomate.
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Nota:
* O Fado Vadio, alma da cidade de Lisboa, ainda existe por aí, embora muitos o julguem extinto e lhe tenham feito saudosistas enterros. Se o leitor destas linhas é daqueles que sente o arrepio profundo quando uma guitarra chora numa taberna de Alfama e desespera de a encontrar pois quando o faz só encontra as tais casas apinocadas para turistas, diga-me para o mail e eu digo-lhe onde está. (este é tipo de informação que, como ao acesso a paraísos naturais, só ganha por ser resguardada).
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domingo, 7 de fevereiro de 2010

Uma Alentejana Diferente

..........Hoje, quando passamos por essa fronteira entre Baixa e Mouraria, a Praça da Figueira, poucos sabem que esta "praça" chama-se assim, não por ser mais uma praça urbana, mas porque albergou durante dois séculos o maior e mais emblemático mercado de Lisboa: A Praça da Figueira.
De planta quadrada, a lembrar o estilo do Bolhão e dos grandes mercados de Barcelona, nasceu em 1755, nos terrenos onde o terramoto arrasou o Hospital de Todos os Santos e lá ficou até 1949.
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A vocação comercial manteve-se, agora já não no centro, ocupado pela estátua de D.João I, mas toda à volta, em casas tão antigas como o Hospital das Bonecas, a Pastelaria Suíça, a Antiga Casa do Bacalhau, a Confeitaria Nacional e, no 10-B, esse curioso supermercado de bairro, o Praça da Figueira.
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Visto por quem passa na rua, o Praça da Figueira resume-se a uma espécie de frutaria em que se habituaram a ver, a preços módicos, espécies diferentes, bananas vermelhas, mandiocas e inhames diversos, coisas de que nem sabemos uso e nome, mas, vencido esse corredor frutícola, abre-se lá para dentro um supermercado onde, a par de tudo o que é normal num pequeno supermercado de bairro, se vendem os melhores cogumelos frescos de Lisboa!
Fresquíssimos, grandes e maciços, ainda com o pé inteiro e com pedaços de micélio, a um incrível preço de €2.49 o quilo, vendem-se ali todos os dias pilhas de caixas, só de manhã que à tarde já não há.

Um dos pratos mais conhecidos da gastronomia alentejana é, curiosamente, um prato algarvio. Falo da famosa Carne de Porco à Alentejana, prato que nem poderia sê-lo, pois onde iriam buscar as amêijoas, produto típico de rias e estuários calmos? José Quitério conta-nos a história* no fim e eu conto-vos como faço uma "Alentejana" deliciosa sem amêijoas e sim com os cogumelos do Praça da Figueira.
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Ingredientes:
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600g de carne de porco, da perna
400g de cogumelos
Alhos, louro, sal, pimenta, vinho branco e massa de pimentão
Banha de porco
Batatas e salada
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Preparação:
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Parta a carne em pedaços do tamanho de uma noz pequena e tempere-a com a vinha de alhos indicada com, pelo menos, 24 horas de antecedência.
Frite a carne em banha, primeiro com lume forte, depois em lume médio/baixo até estar bem cozinhada e o molho apurado.
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Junte então os cogumelos inteiros ou partidos ao meio, consoante o seu tamanho e cozinhe em lume forte durante 1-2 minutos, mexendo sempre. Pode ainda juntar também coentros picados, como na "Alentejana" das amêijoas, embora eu prefira só assim, sem a tirania do coentro sobre o sabor delicado do cogumelo pouco cozinhado.

Sirva com batatas fritas em azeite e salada a gosto.
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Nota histórica: * "Vamos dar o seu a seu dono: o que se chama em todo o país carne de porco à alentejana é efectivamente do Algarve. A coisa deu-se porque o porco algarvio da beira-mar, muitas vezes alimentado com peixe, não gozava de boa fama.
Perante as reclamações dos comensais ao então gosto assardinhado da especialidade local CARNE DE PORCO COM AMÊIJOAS, as casas de pasto algarvias passaram, em determinada altura, a recorrer aos porcos do Alentejo e a anunciar "Carne de porco alentejana com amêijoas".

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Quitério, José - Livro de Bem Comer, 1996, Almedina, pp.63
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