Andava
há anos para fazer este doce, normalmente encarado como alentejano e até motivo de alguma picardia entre as suas supostas origens, o Convento das Chagas de
Vila Viçosa e o das Clarissas de Elvas, chamando-lhe o primeiro sericá e o
elvense, sericaia.
Na verdade é quase certo que terá tido a sua origem no
Brasil, como certo é que foi em Elvas, com a adição de canela, o acompanhamento
com as ameixas em calda e com a projecção que lhe deu a saudosíssima cozinha da
Pousada de Elvas dos anos sessenta e meados de setenta do século passado, que a
sericaia ganhou todo o seu esplendor e se tornou naquilo que hoje é e que
podemos degustar quase em qualquer sítio, até em nossa casa.
Conheci a sericaia em 1977, altura em que a cozinha da
Pousada de Elvas estava já em declínio, depois do apogeu dos anos imediatamente
anteriores à revolução de 1974, e mesmo assim, quando a sericaia apareceu de
surpresa na mesa com uma grande taça de ameixas em calda, apesar de não ter
sido a sobremesa escolhida naquele jantar, constituiu uma festa para o paladar
que hoje recordo com saudade, trinta e cinco anos depois e que me levou a
escolher a sericaia para ilustrar esta 84ª
Trilogia com a Ana e o Amândio, subordinada ao tema ameixas.
Sendo que a sericaia é acompanhada tradicionalmente com
ameixas Rainha Cláudia confeitadas em açúcar, não havendo ainda Rainha Cláudia
disponível e sendo de mau tom ir usar numa trilogia com tema “ameixa”, as ditas
compradas em frasco, usei ameixas destas da época, verduscas, feitas por mim claro está e
o resultado foi excelente.
Ingredientes:
1 pau de canela
Casca de 1 limão
5 ovos
200g de açúcar*
60g de farinha
canela em pó
1 colher de café de sal
Ameixas Rainha Cláudia (ou outras) bem verdes
Açúcar (mesmo peso das ameixas)
Preparação:
Ferva o leite com o pau de canela e a casca de limão e
deixe ficar apenas morno.
Bata as gemas com o açúcar até ficarem fofas e
esbranquiçadas,
Misture a farinha peneirada, dissolva no leite morno e
leve ao lume mexendo sempre até que se forme um creme liso. Deixe amornar.
Bata as claras em castelo firme e incorpore-as no creme,
envolvendo, como se estivesse a preparar um souflée.
Disponha esta massa às colheradas** num prato fundo de barro previamente aquecido,
polvilhe abundantemente com canela moída
e leve a cozer em
forno pré-aquecido a 225ºC, durante cerca de 25 minutos, reduzindo para 180ºC após os primeiros 10 minutos; durante a cozedura a massa cresce
muito e abre fendas à superfície.
Deixe arrefecer (não se assuste, ela vai baixar um tanto…)
e sirva acompanhada de ameixas em calda, que se vendem em frascos, de Elvas, ou
faça-as, cozendo a ameixas que devem estar bem verdes e duras, apenas cobertas
de água e durante meia hora, depois junte-lhes o seu peso de açúcar, deixe
fazer um primeiro ponto, arrefecer, apure em seguida um pouco mais o ponto da
calda com mais uns minutos de fervura, arrefecer de novo por completo, etc.,
durante cerca de três dias
e quatro ou cinco “elevações” do ponto até que as
ameixas estão quase cristalizadas e a calda bem grossa.
Notas:
*A sericaia feita com esta
quantidade de açúcar fica já bastante doce, eu diria o ideal para ser comida
assim mesmo, sem acompanhamento. Ora as ameixas em calda são, apesar do travo ácido,
incrivelmente doces e é preciso um certo estômago muito guloso para que tanto
doce não se torne enjoativo à segunda garfada. Escaldado de outras degustações
de sericaia, usei apenas 160g de açúcar, a contar com o doce das ameixas e não
me arrependi.
** Em quase todas as receitas de
sericaia há uma conversa sobre estas colheradas “desencontradas” ou “cruzadas”
ou ainda “sobrepostas”, resquício do texto do Livro de Receitas do Convento de
Santa Clara, mas que eu não entendi o que quer dizer e pu-las às colheradas,
simplesmente.
Giro! Andei a pesquisar sobre a sericaia, que adoro, menos as ameixas de Elvas. Não percebi aquela das colheradas desencontradas e não juntar ameixas que não fossem só virtuais não me pareceu muito bem...
ResponderEliminarAcabei no porco com ameixas pretas!
Não sei também se o calor do meu forno iria permitir que as «deliciosas» fendas se abrissem...
Beijinhos.
que delicia conhecer a historia deste doce!!!
ResponderEliminaramei!!
http://deliciasdaisa.blogspot.com.br/
Uma perdição! O aspecto é mesmo o menos importante nesta delicia :) Tenho que fazer um dia, obrigado pela receita :)
ResponderEliminarQue perdição!...
ResponderEliminarEsta é sem duvida uma das minhas sobresas favoritas :)
ResponderEliminarBeijinhos
Elisabete Cruz
http://tralhasepanelas.blogspot.pt/
Como sempre uma apresentação perfeita, que nos dá vontade de ir logo para a cozinha e fazer já.
ResponderEliminarBjkas