Existe à volta daquilo a que
geralmente se convenciona chamar Cozinha Tradicional Portuguesa uma enorme
quantidade de mitos e mentiras, umas piedosas, outras simplesmente ignorantes e
finalmente, outras ainda simplesmente oportunistas. Hoje, perdeu-se
praticamente o contacto com aquilo que foi a nossa cozinha ancestral, e quando
digo ancestral estou a falar dos séculos XIX e primeira metade do século XX, já
que para trás será muito difícil encontrar fundamentos para o que viria a ser a
cozinha popular, rural e citadina, que imediatamente antecedeu a do nosso
tempo.
As recolhas de Olleboma, Maria de
Lourdes Modesto e Saramago, reflectem precisamente parte dessa cozinha, embora
só lateralmente aflorem aquilo que foi a verdadeira cozinha popular, feita de
fomes, de carências de toda a ordem, de subsistência quase vegetariana à força
da míngua de proteínas animais, só presentes em dias de festa e que, mercê
dessas vicissitudes, se tornou prodigiosamente criativa.
A par da doçaria e dos grandes
pratos de carne das cozinhas ricas e de festa, que hoje os chefes enfeitam e
modificam aqui e ali para mostrarem serviço criativo, houve outros, aprimorados
pela sabedoria de quem tinha de se haver com menos que muito pouco, dos quais
muitos se perderam, alterados pela ânsia do pobre que já o não é, esquecer o que
já passou. São as açordas que foram de pão, alho e alguma erva cheirosa e hoje
já não se encontram que não sejam feitas nalgum caldo rico com bacalhau, são os
cozidos que passaram de cozinhados temperados com algum pedaço de toucinho e
enchido, a autênticos mostruários de açougue… não há nada que o antigo pobre
mais deteste que aquilo que lhe lembre que já foi pobre e isso afectou
irremediavelmente as recolhas tardias de Modesto e Saramago, sendo que Olleboma,
por questões culturais, nunca chegou realmente a ter contacto com a cozinha
popular pobre.
A Miga da Lousã é um desses
pratos pobres que chegou até nós pela mão de Maria de Lourdes Modesto, embora
muitos, acabrunhados pela ausência de carne a tenham relegado para a categoria
de entrada pitoresca ou até de acompanhamento, coisa que nunca foi.
Para esta 110ª Trilogia com a Ana
e o Amândio, cujo tema é “grelos”, não havia certamente melhor do
que este antigo prato beirão, que ainda por cima é um prodígio de sabor.
Ingredientes:
Ingredientes:
Feijão branco bem cozido
Broa de milho
Grelos cozidos
Alhos
Azeite
Preparação:
Coza o feijão branco de modo a
que fique muito cozido e meio desfeito.
Coza os grelos.
Esfarele a broa de modo a ficar em pedaços mas não em migalhas.
Comece então a dispor estes ingredientes por camadas, começando por uma de feijão, que deve ir bem molhado, a escorrer;
depois uma camada de broa e por fim os grelos cozidos.
Repete-se nesta ordem de modo a que a última camada seja de grelos.
Leva-se azeite ao lume com os alhos e deita-se a ferver sobre a miga.
Sirva logo, assim ou acompanhado de chouriço ou farinheira, assados.
Esfarele a broa de modo a ficar em pedaços mas não em migalhas.
Comece então a dispor estes ingredientes por camadas, começando por uma de feijão, que deve ir bem molhado, a escorrer;
depois uma camada de broa e por fim os grelos cozidos.
Repete-se nesta ordem de modo a que a última camada seja de grelos.
Leva-se azeite ao lume com os alhos e deita-se a ferver sobre a miga.
Sirva logo, assim ou acompanhado de chouriço ou farinheira, assados.
4 comentários:
Gostei de ler, sobretudo a introdução. Obrigado.
João Leal
Consigo aprendo tanta coisa que desconhecia. Mas desde que descobri o seu blog, sigo-o, como se fosse um jornal diário... Obrigada
Muito Bom. Estou a descobrir o interesse pela gastronomia, mas mais importante a historia sobre a gastronomia portuguesa. Desconhecia por completo que se assentava sobre uma cozinha pobre, mas vendo bem, as açordas, os caldos, migas... Vem mostrar que é mesmo assim.
Boa noite, mais uma publicação deliciosa! As suas receitas com história são fascinantes e levam o blogculinário para um nivel superior. Eu sou sua modesta seguidora e decidi, recentemente, começar um blog que gostaria que visitasse. Sou uma principiante nestas coisas da blogosfera, e não tenho um milésimo do seu talente. De qualquer modo, seria uma honra receber a sua visita em http://comidadeconforto.blogspot.pt/
Obrigada.
Lina
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