domingo, 8 de setembro de 2019

OS PUXAVANTES (1)

       
              Puxavante é um termo que hoje caiu em desuso, de tal modo que serão já poucos os que lhe conhecem o significado.
Ligado directamente a uma cultura masculina de tabernas, puxavante designa aqueles salgados que, oferecidos pela casa, serviam para acompanhar o verdadeiro negócio do sítio, a venda de vinho ou cerveja.
Ainda hoje o puxavante é uma instituição na vizinha Espanha onde basta pedir uma cerveja para se ser presenteado com uma “tapa”, um pratinho de “tortilla” ou outra qualquer ajuda para aquela e para a próxima cerveja e que nos deixa a nós, portugueses, geralmente encantados. Por cá, até o famoso “marisco saloio”, os tremoços, tornou-se uma raridade que muitas vezes é cobrado.
Culpa da proliferação de uma restauração chamada de “petiscos”, soubemos imitar a criatividade dos espanhóis mas não a sua hospitalidade e hoje pagam-se tremoços, azeitonas, três rodelas de mau chouriço, uns amendoins, uns cubinhos de fiambre industrial salpicados de pickles ou um pires de feijão frade e ovo cozido onde não se consegue distinguir um mísero fragmento do atum que lhe deu nome. 
Tudo facturado, pois claro, e eu a sonhar com os tempos em que na taberna existente no prédio em que nasci, alinhados sobre o balcão onde o Sr. Pereira servia os copos de três estavam os puxavantes do dia, umas tirinhas de broa de milho com um bocadito de presunto ou uma lasca milimétrica de bacalhau cru, umas petingas ou jaquinzinhos de escabeche, uns queijinhos que viviam num grande boião cheio de azeite. Serviam para ajudar a despejar os grandes pipos de vinho de Aveiras, que não estava ali para outra coisa e não se deve deixar a bebida “cair na fraqueza”. 
O Outono já vem aí, época ideal para as grandes conversas a acompanhar uma garrafa e para pôr na mesa um puxavante desses que pedem mais um copo, para soltar a conversa. 
Sob a designação de “PUXAVANTES” vou aqui deixar uma série dessas humildes maravilhas, começando hoje pelas deliciosas Espadilhas , os substitutos sustentáveis para os saudosos da tão ameaçada petinga. 

Ingredientes :

Espadilhas congeladas 
Sal
Farinha
Óleo para fritar

Preparação :

As espadilhas (Sprattus sprattus) são pequenos peixes desprezados pelos pescadores portugueses que são pescados pelos búlgaros no Mar Negro, congeladas e exportadas. 

Aparentadas com a petinga e as anchovas, são ainda muito mais pequenas, entre 3 e 5cm e têm a enorme vantagem de não constituir um crime ecológico e ambiental a sua captura, como infelizmente continua a suceder entre nós com a petinga, com a conivência de quem deveria fiscalizar e a cumplicidade de quem as compra e consome. 
As espadilhas vendem-se congeladas em supermercados e após descongelamento fazem-se exactamente como qualquer outro peixe frito. Levemente salgadas, enfarinham-se com farinha de trigo (ou outras sem glúten, por exemplo)
e fritam-se em óleo quente e abundante de modo a não precisarem de ser viradas. 
Escorridas em papel absorvente, está pronto o puxavante
que neste caso foi para um branco alentejano* bem gelado, que o tempo ainda vai quente. 
Comem-se uma
(ou duas, ou três…) de cada vez… 

Nota
* Como sabem, não se aconselham ou indicam vinhos neste blog, onde se segue a máxima do primado do gosto de cada um.