quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Lulas Recheadas com Camarão


             As lulas, pelo seu feitio semi-fechado e alongado, parecem ter sido “inventadas” para serem recheadas e na verdade é difícil encontrar melhor destino para este saboroso cefalópode.           
Infelizmente, trata-se de um prato algo trabalhoso o que facilita a opção por lulas industriais já recheadas. Não existe, no entanto, uma única oferta que apresente aquilo a que poderíamos chamar uma qualidade gastronómica mínima exigível, o que deixa aos amantes deste delicioso prato o recurso de fazê-lo pelas próprias mãos.
Sendo esta 43ª Trilogia com a Ana e o Cupido, regida pelo tema “lulas”, foi natural esta escolha  e,  porque na nossa casa todas as experiências são possíveis, ensaiou-se o uso do camarão no recheio, cujo resultado superou as melhores expectativas.

Ingredientes (3 pessoas):

6 Lulas (ou potas) com 1 palmo (o tubo)
2 cebolas médias
2+2 dentes de alho
150g de miolo de camarão
1/2 Chouriço alentejano
3+3 colheres de sopa de azeite
Vinho branco, seco
Sal, pimenta preta, pimentão doce, noz moscada e coentros frescos.
Tosta ralada clara

Preparação:

Amanhe as lulas deixando a pele* e as "barbatanas", aquelas asas junto da extremidade.
Coza as cabeças durante cerca de 25minutos (40m para as potas).
Pique uma cebola e dois dentes de alho e refogue-os em 3 colheres de sopa de azeite, junte as cabeças cortadas em pedaços e o chouriço em pequeníssimos cubos,
 tempere com sal, pimenta preta e pimentão doce e um pouco de noz moscada raspada no momento. Envolva e deixe fritar ligeiramente até não sobrar qualquer líquido aquoso.
Junte então o miolo de camarão e os coentros,
 junte o sumo de limão, deixe evaporar o sumo quase completamente e envolva tudo com três colheres de sopa de tosta ralada.
Encha os tubos com este recheio apenas até pouco mais de metade e feche-os com um palito.
Refogue a outra cebola e os alhos no restante azeite. Tempere com sal, pimenta e ponha as lulas recheadas neste refogado.
As lulas reduzem de modo dramático e começam a libertar muito líquido o que deve ser encorajado, picando-as com um palito aguçado, muitas vezes de cada lado para facilitar a saída de líquido.
Esta operação faz-se de modo continuado até ao fim da confecção. Sempre que este líquido acabar e começar a fritar a lula, junta-se um pouco de vinho  para não deixar queimar.
Ao fim de 20-30 minutos as lulas estão com uma bela cor dourada e já não deitam líquido quando espetadas. O cozinhado está pronto.

Como acompanhamento, optei por um puré de batatas cozidas em água e sal, espremidas, salpicadas com orégãos e regadas com manteiga fundida 
e uma salada de alface e rabanetes.

Nota: * As lulas são forradas por um tegumento fino e deslizante, cheio de pequenos pontos arroxeados que, em vida do animal, são responsáveis pela sua quase inacreditável capacidade para tomar qualquer cor de forma quase instantânea. Em termos culinários esta pele é responsável por boa parte do sabor de uma lula e também pelo escurecimento dos pratos e pela diminuição da apresentação da própria lula cozinhada, que perde a sua cor clara marfinada.

Se a sua cozinha, ou um específico prato feito com lulas, é orientado para a perfeição da apresentação, sendo o sabor secundário, então deve fazer como H. Sá Pessoa que, pelo menos em programas de televisão, esfola cuidadosamente as lulas, o que se compreende dado que  ainda não há televisão com sabor.
Se quiser orientar o seu prato no sentido do seu sabor pleno, então há que conservar a “pele” das lulas, cuidadosamente..

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Pescada em tomate


                Nessa altura incerta da meninice, quando em nós se separam Bem e Mal, certo e errado, deuses e demónios, o brinde e a fava, tudo se hierarquiza nessa dualidade maniqueísta de extremos, gosto por comidas também, pois claro, coroado por um provável bife (hoje talvez hambúrguer) com batatas fritas, na ponta principal e na outra, a detestada, estará com grande probabilidade, o peixe cozido com batatas cozidas, pescada evidentemente.
Quando o Cupido indicou “Pescada” como tema para esta 42ª Trilogia comigo e com a Ana, o meu coração balançou entre a canónica “pescada cozida com todos” que tanto odiei e que hoje adoro, e os filetes de pescada fresca, que sempre adorei, mas decidi-me enfim por um prato que era a maneira mais consensual de se comer pescada na minha casa de infância, todos gostavam e a minha mãe, sábia na gestão destes pequenos dramas familiares à mesa, fazia-a amiúde, matando assim antes de nascerem, disputas e birras.
Hoje, os problemas que a pescada levanta são outros, desaparecidas que são, para sempre, as grandes pescadas da nossa costa atlântica, dizimadas as pescadas e a frota que as pescava, e nós a termos que nos contentar com as pescadas e desembarcadas em Vigo, quase sempre de arrasto e a terem ainda de viajar até aqui.
A pescada de excelência tem de ser pescada à linha* e hoje, já praticamente só se pratica esta arte no Chile (também nos Açores mas a “pescada” açoreana é outra espécie), onde as frias e rochosas águas da Patagónia, Terra do Fogo e Estreito de Magalhães não permitem o arrasto e que por isso continuam a produzir as mais espantosas pescadas, congeladas é certo, caras, mas que continuam a ter essa qualidade ímpar das velhas pescadas de há 50 anos atrás.

Ingredientes:

Pescada congelada nº4 ou nº5, do Chile
Cebola
Tomate bem maduro
Alhos
Azeite virgem
Louro
Salsa
Sal e pimenta
Batata frita em rodelas finas**

Preparação:

Salgue ao de leve as postas de pescada uma hora antes de cozinhá-la.
Pele tomates maduros, esmague-os grosseiramente e leve-os ao lume com o azeite, cebola e alhos.
 Deixe evaporar o muito liquido que se forma, triture com a varinha até ter um molho liso, tempere, junte a salsa picada e o louro, disponha as postas neste molho de modo a que fiquem quase imersas nele.
Deixe cozer em lume muito baixo, sem quase ferver, durante cerca de 10 minutos.
Apague e deixe o peixe neste molho, tacho tapado, durante mais 10 minutos e sirva então acompanhado de batatas fritas em rodelas** finas, quentes,
 de modo a que fiquem estaladiças no bordo e ainda algo moles no centro, molhadas com o molho do peixe.

Nota: * A pesca por arrasto, para além de constituir uma selvajaria ambiental, deixa os peixes capturados amassados pelo peso de toneladas de peixe e detritos que são arrastados em conjunto dentro do saco de rede ao ser içado para bordo.
Ao contrário, a pesca à linha ou por rede de emalhar, ao promover a pesca de indivíduos isolados, preserva as suas características e integridade.
** - Aqui, há que resistir à tentação óbvia de usar as batatas de pacote, pois mesmo as mais “caseiras” têm sempre sal agarrado e não substituem as congéneres feitas em casa, temperadas com o adocicado do tomate e não com o sal. Nalguns take-away há batatas destas vendidas a peso e que se podem pedir sem sal. 

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Ovos em tomate


           Quando em abril passado a Colher de Pau publicou esta receita no seu blog As Minhas Receitas, disse logo para comigo que apenas lhe podia apontar um “erro” e mesmo esse, não culinário, que a Colher de Pau não tem por hábito deixar créditos culinários por mãos alheias: aqueles seus Ovos em Tomate estavam ali, perfeitos em tudo exceto no tempo; definitivamente, aquele não era um prato para o tomate de abril e sim um prato que apenas se pode preparar no verão, quando o tomate está maduro, vermelho e saboroso em todo o seu esplendor natural.
Desde abril que espero a oportunidade perfeita para experimentar este prato simples e rápido, um verdadeiro prato de verão e de férias. Ela surgiu agora.

Ingredientes:

Tomates médios (180/200g) maduros e firmes
Ovos (1 ovo por cada tomate)
Azeite
Sal e pimenta
Ervas aromáticas a gosto

Preparação:

Verifique qual o lado do tomate que tem melhor base de sustentação e corte uma tampa do lado oposto, que será o lado virado para cima.
Com o auxílio de uma colher de chá, vaze o interior dos tomates, deixando uma grossura apreciável no fundo e paredes.
Seque o interior dos frutos com papel absorvente, durante uns minutos.
Tempere o interior com sal, pimenta, ervas aromáticas a gosto (usei manjericão e orégão) e parta um ovo para cada cavidade,
 tendo o cuidado de verificar que fique um espaço de 1 – 2 cm até ao bordo, que vai descer no forno.
Tempere o ovo com pimenta moída no momento, passe um fio de azeite (se tiver um aspersor de azeite, melhor)
 e leve ao forno muito quente durante cerca de 5-7minutos, de modo a que o tomate asse, a clara fique dura e a gema ainda cremosa.
Sirva quente ou, melhor ainda, morno.

domingo, 21 de agosto de 2011

Molho de tomate


                    Oriundos do Novo Mundo e encarados na Europa durante mais de 2 séculos como uma curiosidade venenosa, os tomates conquistaram um lugar ímpar na cozinha mediterrânica e são hoje um elemento imprescindível na cozinha moderna.
Entre nós, o tomate fresco está aparentemente disponível durante todo o ano mas apenas durante o verão apresenta características para ser usado fresco na cozinha, sendo que o de estufa, que se vende de outubro a junho, é imprestável e mais vale usar durante esses meses o tomate de conserva, feito com o bom tomate de verão.
O post de hoje versa o molho de tomate, o que até pode parecer alguma brincadeira, dada a simplicidade elementar da sua preparação, mas não é: quase todos os que já provaram um simples molho de tomate, em Itália, onde é rei, sabem que há por lá uma “pureza” de sabor que, de alguma forma, se perde nos molhos de tomate portugueses, chegando por vezes a pensar-se ser o tomate italiano melhor que o nosso.
Mas não! A “culpa” da diferença está numa quase compulsão para fazermos fritar o tomate com cebola e alho, o que dá aos molhos de tomate em Portugal um sabor guisado que, sendo tão bom para tantos e tantos pratos do nosso contentamento, não é de facto molho de tomate mas sim molho de refogado.

Ingredientes:

Tomates bem maduros
Azeite virgem
Sálvia
Orégãos ou mangericão
Vinagre balsâmico**
Sal e pimenta
Parmesão (facultativo)

Preparação:

Use meio quilo de tomate fresco por cada porção de 150/200g de molho final. Usei neste molho para dois, cerca de 1,2 Kg de tomate, sete tomates granditos.
Pele os tomates pelo método que preferir; eu uso metê-los em água a ferver por cerca de 30 segundos, até que aparecem uns golpes na pele e esta começa a encaracolar-se, solta. Depois é só puxar e sai sem qualquer dificuldade.
Esmague grosseiramente os tomates pelados*, numa frigideira, com o auxílio de um garfo ou, como eu gosto (nunca perco uma oportunidade de meter a “mão na massa”), espremendo-os com as mãos.
 Leve-os ao lume com um pouco de sal até ferverem, o que vai libertar uma quantidade imensa de líquido. Escorra e rejeite este líquido** e volte ao lume a parte sólida, agora com 2 folhas de sálvia (ou outra erva a seu gosto) e  cerca de 75ml de azeite (5 colheres de sopa), sal e pimenta preta.
 Deixe ferver em lume alto até o líquido evaporar e obter a consistência de molho que deseja.
Junte no fim os orégãos ou o mangericão   
e um golpe de vinagre balsâmico** e sirva como entrada ou refeição leve, sobre massa cozida a gosto. Se quiser, polvilhe com parmesão ou Grana Padano, ralado no momento***.

Notas: * Na “alta” cozinha que por aí se divulga, normalmente mais preocupada com apresentação e empratamento que com o sabor do prato, que importa vistoso e “artístico”, aparece muito a indicação de retirar, além da pele, também as sementes e geleia interna do tomate, o que é uma prática que lhe remove grande parte do sabor e acidez e que, francamente, é apropriada para fazer um prato com tomate para quem odeie tomate.
** O tomate é composto por mais de 95% de água, cuja evaporação é forçosamente lenta. Neste líquido do tomate está a maior parte do ácido cítrico, pelo que, se usar o método rápido de rejeitar o líquido, que indiquei, deve repor essa acidez perdida com o golpe de vinagre balsâmico final. Se tiver muito tempo, deixe evaporar toda aquela água e não use depois o vinagre.
*** O queijo ralado por cima estraga irremediavelmente a cor vermelha viva do molho, dando-lhe um tom alaranjado/acastanhado. Resolvo esse problema estético, polvilhando a massa com o queijo e pondo então o molho por cima, que fica bem vermelho e apetitoso. 

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Açorda de Camarões



         Nunca percebi bem esta coisa de chamar “frutos do mar” aos mariscos, provavelmente mais um exemplo da velha mania das traduções mal pensadas das expressões usadas pela “cuisine”: em francês diz-se fruits de mer para designar mariscos e nós lá passámos a chamar frutos do mar aos mariscos (como chamamos abacaxi ao ananás!) apesar de ser expressão que, na nossa língua, não faz sentido nenhum.
Mas o certo é que pegou, ficou e hoje é até o tema para esta 41ª trilogia com a Ana e o Cupido e ao mesmo tempo recomeço da atividade, ao vivo, do Outras Comidas após as férias alentejanas. E como se vem ainda com o balanço desta nossa cozinha montemorense em que o pão é rei, nada melhor que uma açorda de camarões, no plural porque se usaram duas variedades, uma para enfeitar e outra para comer, que nestas coisas do marisco, encher o olho pesa na carteira e não no sabor.

Ingredientes:

Camarão pequeno, congelado em cru (usei de aquacultura)
Camarão grande, congelado em cru
Pão duro
Azeite virgem
Alhos
Sal e pimenta
Salsa 

Preparação:

As açordas de camarão, e as de marisco em geral, são peças culinárias de grande simplicidade mas que exigem uma execução muito cuidada em todos os aspetos da preparação; cozimento em condições deficientes do marisco, muito sal na sua cozedura, pão demasiado encorpado (ao contrário da maioria das açordas, aqui quer-se pão fino), alhos muito fritos, marisco pré-cozido e, mais que tudo, a pressa, podem arruinar, e arruínam amiúde, a mais bem intencionada das açordas.
Cubra os camarões previamente descongelados com água fria  temperada com pouco sal,
 leva ao lume e, mal comece a borbulhar junto à parede do tacho, apague o lume, tape e espere alguns minutos.
 Retire-os da água, descasque os pequenos e reserve o miolo. Separe os camarões grandes e introduza-os em água fria bem salgada durante cerca de meia hora, para que tomem sal.
Parta em pedaços pequenos as cascas e cabeças, com o auxílio de uma faca e ponha os pedaços de novo ao lume na água onde tinham cozido, agora em lume mínimo, com tampa e durante uma hora.
Passe o caldo de cozedura por um passador de rede e, com ele, regue o pão que deve ficar bem encharcado. Se o caldo for insuficiente, use água para acrescentar.
Leve o azeite ao lume baixo e coza nele os alhos, em fatias finas, sem deixar alourar.
Vaze então sobre este azeite o pão encharcado e mexa ocasionalmente com colher de pau, primeiro com lume forte até levantar fervura,  junte metade da salsa picada e deixe com lume mínimo durante 40-60 minutos, durante os quais vai sempre mexendo a açorda e acrescentando água se necessário.
A açorda está cozida quando desaparecem todos os vestígios do pão que a originou e toma um aspecto liso, brilhante e translúcido.
Prove e retifique o sal e pimenta.
Apague o lume e junte os camarões descascados.
 Envolva, tape e deixe um minuto a trocar sabor e a baixar a temperatura do creme. Passe para o prato de serviço, decore com os camarões grandes e a salsa picada, 


e sirva logo.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Farófias



    
           As farófias feitas à antiga, cozidas em leite perfumado com casca de limão, bem doces e polvilhadas com canela, são hoje uma sobremesa injustamente esquecida, mas nem por isso menos sedutora.
Encarada como doce de facilidade extrema, as farófias têm aspetos a observar na sua preparação de modo a que “desapareça” na boca como deve, qual nuvem doce.
Apesar desta suposta facilidade, é frequente haver fracassos rotundos e inexplicados com travessas inteiras a seguir para o lixo com as farófias abatidas e duras como borracha e ninguém a saber o porquê. É que tem mesmo muito que se lhe diga,  a confecção de uma farófia e pensei logo nelas para satisfazer o tema “sobremesas”, proposto pela Ana para esta 40ª Trilogia, comigo e com o Cupido.



Ingredientes:

6 Ovos muito frescos*
175g de Açúcar
1 pitada de Sal
1l de Leite
Casca de 1 Limão
1 colher de sopa de Maizena
Canela em pó

Preparação:

Separe cuidadosamente as claras das gemas e certifique-se que não há qualquer vestígio de gema nas claras.
Ponha o leite ao lume num tacho largo, com a casca do limão e 125g do açúcar. Deixe ferver.
Adicione uma pitada de sal às claras e bata-as até estarem em castelo pouco firme. Nesta altura adicione o restante açúcar (50g) e continue a bater até obter um merengue muito firme.

Com o auxílio de uma colher grande, ponha colheradas de merengue no leite, que deve estar apenas no limiar da fervura e com o lume no mínimo. Este pormenor é fulcral: as claras cozem a 60ºC e o calor demasiado faz as farófias ficarem murchas e emborrachadas. Coza-as rigorosamente 20 segundos de um lado e cerca de 15 do outro.
Retire-as imediatamente do leite para escorrerem.

Quando tiver cozido a última, coe o leite, deixe amornar, junte-lhe as gemas ligeiramente mexidas mas não batidas, a colher de Maizena ( que não é verdadeiramente necessária mas ajuda a evitar acidentes de talhar o leite creme), e leve de novo ao lume para espessar.
Disponha-as num tabuleiro fundo,
regue-as com este molho que é, na verdade, um leite creme. 

Deixe arrefecer completamente e polvilhe então com abundante canela. 

Nota: * A farófia perfeita deve ter uma camada exterior firme mas o interior deve manter-se suave, pronto a desfazer-se na boca a cada colherada. Isto faz com que parte das claras não sejam sujeitas a temperaturas de segurança microbiológica e portanto só devem usar-se ovos muito frescos e de absoluta confiança.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Caril de Peixe e Coco à Moda de Gôa



         Caril é uma palavra oriunda do tamil kira que significa simplesmente molho.
Não existe qualquer composição certa para essa mistura de especiarias e condimentos que pode variar entre meia dúzia e algumas dezenas, sendo normal que na Índia cada família tenha a sua própria fórmula, por vezes secreta e o caril seja preparado no momento da confeção do prato e de acordo com ele.
Normalmente, por uma questão de comodidade (e de ignorância também) uso caril comprado já misturado variando apenas a marca conforme quero um resultado mais aromático ou mais picante, sendo que neste capítulo só vou até ao "médium hot" e mesmo assim só em ocasiões muito específicas.
Mas desta vez em que o tema para esta 39ª Trilogia, proposta do Cupido para eu e a Ana acompanharmos era precisamente “caril”, decidi que pela primeira vez iria confecionar o meu caril. 

Ingredientes:

Pescada congelada nº5 do Chile
Pasta caseira de caril
Cebola
Alho
Óleo de girassol
Leite de coco (cremoso)
Sal
Arroz basmati ou agulha
Anis estrelado

Preparação:

Prepare filetes grossos de peixe e ponha-lhes umas pedrinhas de sal. Reserve.
Para a preparação do caril reduza a pó os elementos sólidos secos (comecei no almofariz mas era um trabalho inglório e acabou por só ficar em pó fino no moínho elétrico), rale os frescos 
e reduza tudo a uma pasta com um pouco de água. Usei 1 colher de sopa de sementes de coentro indiano, uma colher de sobremesa de cominhos, 4 vagens de cardamomo negro (sementes), dois pedaços de curcuma fresca (açafrão das Índias), 1 colher de chá de canela moída, um pedaço de gengibre fresco, 5 bagas de piri-piri (na verdade só usei duas), 1 colher de sobremesa de pimenta preta e pedaços de macis*. Claro que pode usar um bom caril de compra, a seu gosto, em pó ou em pasta.** Se usar em pó humedeça-a previamente até ela ficar uma massa húmida e maleável.
Estale cebola, umas rodelas de gengibre fresco e alho picados num fundo de óleo 
e junte a pasta de caril; deixe fritar um pouco e adicione então o creme de coco***. Mexa e deixe ferver até que a pasta de caril esteja totalmente homogénea no molho. Prove e tempere então com o sal.

Introduza o peixe no molho e deixe cozinhar em lume baixo por alguns minutos, o estritamente necessário ao cozimento. 

Sirva com arroz basmati ou agulha cozido com sal e anis estrelado.



Notas: * Não incluí inicialmente o cravinho, por não ser sabor das minhas simpatias culinárias; no entanto, ao provar o molho, a sua falta era evidente e juntei uma colher de café de cravinho moído que deu ao conjunto o tal toque que faltava.
** As marcas de temperos de supermercado (Margão, Janota, etc.) apresentam uns pós com o nome de caril, lamentáveis. Aqui, vale mesmo a pena a visita a uma loja de produtos indianos e o conselho do profissional que aí encontrar, nomeadamente no que respeita ao picante; por norma o “mild” pode-se dizer que é ideal, o “médium” o que chamamos bem puxado e o “hot” é puro suicídio! Compro os meus produtos indianos na Popat Store do C.C. Mouraria (caril Jalpur e frescos), ou numa loja surpreendente, uma espécie de “indiano gourmet” na Av. Visconde Valmor 34, A, (caril Madras mild Fudco).
*** Ao comprar leite de coco, normalmente em lata ou pacote tetrapak, deve reparar se se trata do leite cremoso (indicado como culinário, ou dessert) ou do leite de coco “bebida”, que é totalmente aquoso e inapropriado para cozinhar pois não engrossa os molhos.