Li “A Cidade e as Serras” há quase 40 anos, por obrigação liceal, numa altura em que teria preferido gastar esse tempo com as aventuras do Major Alvega! Depois, foi apenas um dos tiveram de ficar para trás, que a vida compraz-se nessa crueldade medonha de dar-nos tantos livros e tão pouco tempo...
Mas eis que afinal, sem que nada o fizesse esperar, aí estavam de novo, Jacinto e José Fernandes, às voltas com as suas favas no blog da Laranja com Canela! Fui ler a passagem no livro há quarenta anos fechado. A mágica prosa de Eça operou então, de súbito, o sortilégio há tanto tempo ali guardado: além de leitura fez-se jantar, que um Arroz de Favas assim elogiado não pode ficar sem prova. Assim:
“Deste enlevo nos arrancou o Melchior com o doce aviso do “jantarinho de suas incelências”. Era noutra sala, mais nua, mais abandonada: - e aí logo à porta o meu supercivilizado Príncipe estacou, estarrecido pelo desconforto, e escassez e rudeza das coisas. (...)
Jacinto ocupou a sede ancestral – e durante momentos (de esgazeada ansiedade para o caseiro excelente) esfregou energicamente, com a ponta da toalha, o garfo negro, a fosca colher de estanho. Depois, desconfiado, provou o caldo, que era de galinha e rescendia. Provou – e levantou para mim, seu camarada de misérias, uns olhos que brilharam, surpreendidos. Tornou a sorver uma colherada mais cheia, mais considerada. E sorriu, com espanto: - “Está bom!”
Estava precioso: tinha fígado e tinha moela; o seu perfume enternecia; três vezes, fervorosamente, ataquei aquele caldo.
-Também lá volto! – exclamava Jacinto com uma convicção imensa. – É que estou com uma fome... Santo Deus! Há anos que não sinto esta fome.
Foi ele que rapou avaramente a sopeira. E já espreitava a porta, esperando a portadora dos pitéus, a rija moça de peitos trementes, que enfim surgiu, mais esbraseada, abalando o sobrado – e pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominava favas!... Tentou todavia uma garfada tímida – e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:
-Óptimo!... Ah, destas favas, sim! Ó que fava! Que delícia! (...)
- Pois é cá a comidinha dos moços da Quinta! E cada pratada, que até suas Incelências se riam... Mas agora, aqui, o Sr. D. Jacinto, também vai engordar e enrijar!”
Mas eis que afinal, sem que nada o fizesse esperar, aí estavam de novo, Jacinto e José Fernandes, às voltas com as suas favas no blog da Laranja com Canela! Fui ler a passagem no livro há quarenta anos fechado. A mágica prosa de Eça operou então, de súbito, o sortilégio há tanto tempo ali guardado: além de leitura fez-se jantar, que um Arroz de Favas assim elogiado não pode ficar sem prova. Assim:
“Deste enlevo nos arrancou o Melchior com o doce aviso do “jantarinho de suas incelências”. Era noutra sala, mais nua, mais abandonada: - e aí logo à porta o meu supercivilizado Príncipe estacou, estarrecido pelo desconforto, e escassez e rudeza das coisas. (...)
Jacinto ocupou a sede ancestral – e durante momentos (de esgazeada ansiedade para o caseiro excelente) esfregou energicamente, com a ponta da toalha, o garfo negro, a fosca colher de estanho. Depois, desconfiado, provou o caldo, que era de galinha e rescendia. Provou – e levantou para mim, seu camarada de misérias, uns olhos que brilharam, surpreendidos. Tornou a sorver uma colherada mais cheia, mais considerada. E sorriu, com espanto: - “Está bom!”
Estava precioso: tinha fígado e tinha moela; o seu perfume enternecia; três vezes, fervorosamente, ataquei aquele caldo.
-Também lá volto! – exclamava Jacinto com uma convicção imensa. – É que estou com uma fome... Santo Deus! Há anos que não sinto esta fome.
Foi ele que rapou avaramente a sopeira. E já espreitava a porta, esperando a portadora dos pitéus, a rija moça de peitos trementes, que enfim surgiu, mais esbraseada, abalando o sobrado – e pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominava favas!... Tentou todavia uma garfada tímida – e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:
-Óptimo!... Ah, destas favas, sim! Ó que fava! Que delícia! (...)
- Pois é cá a comidinha dos moços da Quinta! E cada pratada, que até suas Incelências se riam... Mas agora, aqui, o Sr. D. Jacinto, também vai engordar e enrijar!”
Eça de Queiroz, in A Cidade e as Serras
Ingredientes:
Favas
Cebola
Alhos
Azeite
Louro
Sal
Pimenta
Arroz
Preparação:
Refogue e aloure uma cebola grande, picada, e alguns dentes de alho em azeite, junte as favas previamente descascadas e um pouco de caldo de carne ou de frango e deixe cozer durante cinco minutos. Junte então duas folhas de louro e três chávenas de água de cozer frango.
Quando levantar fervura tempere com pimenta, rectifique o sal e junte depois uma chávena de arroz. Quando estiver cozido, arrefeça um pouco o tacho mergulhando-o em água fria para que o arroz se mantenha "malandro".
Entretanto aloure pedaços de frango cozido, numa frigideira com um pouco de azeite onde previamente tinha alourado alguns dentes de alho e acompanhe com o arroz.
Ingredientes:
Favas
Cebola
Alhos
Azeite
Louro
Sal
Pimenta
Arroz
Preparação:
Refogue e aloure uma cebola grande, picada, e alguns dentes de alho em azeite, junte as favas previamente descascadas e um pouco de caldo de carne ou de frango e deixe cozer durante cinco minutos. Junte então duas folhas de louro e três chávenas de água de cozer frango.
Quando levantar fervura tempere com pimenta, rectifique o sal e junte depois uma chávena de arroz. Quando estiver cozido, arrefeça um pouco o tacho mergulhando-o em água fria para que o arroz se mantenha "malandro".
Entretanto aloure pedaços de frango cozido, numa frigideira com um pouco de azeite onde previamente tinha alourado alguns dentes de alho e acompanhe com o arroz.
6 comentários:
Gostei bastante deste arroz de favas; o frango feito assim, é sem dúvida um belo acompanhamento.
não sei se gostei mais da receita do arroz ou se da narrativa.
a sua escrita é sempre cativante.
Jamais me lembraria de arroz de favas para acompanhar frango, maravilha!
Eça será sempre um dos meus escritores preferidos.
Um bj
Adoro favas como já deu para ver!!!
Surpreendeu-me com este arroz,deve ser fabuloso.
Adorei recordar "EÇA" um escritor excelente!
Janeca!
Nunca comi arroz de favas, mas li com muito gosto «A Cidade e as Serras» do grande Eça.
Foi uma deliciosa obrigação do liceu...
O Luís já pensou em escrever 1 livro de memórias gastronómicas? É que a sua forma de escrever é fascinante...
Dúdida: não sei se gosto mais da receita, do texto do Eça, do mosdo como você tempera seu texto... Enfim, acho que fico com os três.
Amigo, um primor, como sempre.
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