O processo caótico não tem só desvantagens, e a minha despensa que o diga! Arrumada metodicamente de tempos a tempos, de tal modo que diria, quem não conhecesse o dono, que se tratava de uma despensa pertencente a alguém obsessivamente organizado, essa arrumação é fugaz e corresponde apenas a uma reacção natural ao estado de caos absoluto, o estado em que nada, mas mesmo nada se consegue encontrar, para lá do primeiro plano, mesmo esse aleatório e fortuito.
Às vezes, por momentos, chego a invejar aqueles que, mercê de um pequeno esforço diário de método e organização, sabem sempre a quantas andam e com o que podem contar, até na sua despensa. Mas esses eventuais devaneios depressa são ultrapassados pelo subtil mas inexorável avanço do caos que, na sua missão de garantir a prevalência das leis universais da entropia, prepara afinal, na minha despensa, aquilo que o metódico jamais experimentará: a sublime aventura de descoberta do desconhecido, que se opera como se de um milagre se tratasse, a cada nova e esporádica arrumação!
Ontem, feriado a meio da semana, sós em casa, eu e minha mulher, foi dia da grande aventura. Ao princípio sempre um pouco receada, pela dimensão da tarefa, depressa se é conquistado pelo aparecer, das brumas das prateleiras e do tempo, daquelas coisas que foram compradas num determinado contexto que entretanto mudou, e logo esquecidas lá atrás, dos vestígios de gastronomias estranhas que se trouxeram de viagens passadas ou por amigos que se lembraram de nós nalguma paragem exótica. Aparecem os pomodori secchi da Toscana, ainda à espera de serem metidos em azeite, surge um grande saco com as “cascas” compradas em Bragança, à espera de uma receita que não inclua aquelas partes tradicionais, mas detestadas, do porco, outro saco com maravilhosos cogumelos Boletos Porcinni, o frasco com as preciosíssimas trufas negras, que de tão preciosas nunca mais se arranja coragem para experimentar, as caixas com os diversos exotismos, a do Sushi, a das coisas chinesas, a das coisas indianas com o seu frasco de portentoso caril comprado avulso, na rua, em Bombaim e as sempre esquecidas sementes de cardamomo, e o óleo de palma, e as estrelas de anis, e, e...
Foi destas caixas que saiu o almoço, de fusão e por força tardio.
Mas valeu a pena, oh se valeu!
Ingredientes:
300g de carne limpa de frango
2 colheres de sopa de Azeite
2+2 colheres de sopa de Óleo de Palma
2 colheres de sopa de Caril Indiano
3 dentes de Alho
5 vagens de Cardamono
2 colheres de sopa de mel
5 malaguetas “jidungo”
1 copo de leite
1 copo de grão-de-bico cozido
1/8 de ananaz
1 molho de Espargos Verdes
2 Cenouras
6 Champignons
Sal
250g de massa “cuscus” (Pisellini)
Alguns estames de Açafrão
Tomilho Limão fresco
Preparação:
Corte a carne em tirinhas como para Strogonov. Reserve.
Derreta 2 colheres de sopa de óleo de palma com o azeite e aloure nesta gordura a cenoura e os alhos, ambos cortados em pedaços. Junte a carne e salteie em lume forte, mexendo sempre. Junte o caril e o copo de leite, deixe levantar fervura, baixe o lume, tape a deixe cozer por 15 minutos. Enquanto a carne coze, esmague num almofariz, grosseiramente, as malaguetas e as sementes de cardamomo que retirou previamente das vagens. Descasque e corte em pedaços pequenos uma fatia de ananás correspondente a um oitavo do fruto. Junte então à panela as malaguetas, o cardamomo, o ananás, o copo de grão-de-bico cozido, as pontas tenras dos espargos verdes, os cogumelos fatiados e o mel. Prove e tempere de sal, tendo em conta que ainda vai evaporar parte do líquido. Deixe apurar até o molho começar a espessar.
Coza a massa em água com bastante sal, lave depois em água fria corrente e escorra. Reserve.
Toste ligeiramente no forno alguns estames de açafrão, mas sem deixar queimar e reduza-os a pó, no almofariz ou com a ponta de uma faca sobre a pedra. Adicione este açafrão a duas colheres de sopa de óleo de palma e aqueça numa panela mas sem deixar fritar. Ponha os cuscus cozidos nesta panela, envolva nesta gordura amarela e aqueça ao lume mexendo sempre para não pegar.
Sirva salpicado com folhas frescas de Tomilho Limão.
Nota:
Com a dose mencionada de malagueta, o prato fica “quente”, mas não “goês”. Se é sensível a picantes reduza a dose, se, pelo contrário, gosta destas comidas a queimar, já sabe...
As quantidades indicadas fizeram uma refeição que foi comida, à vontade, por duas pessoas e sobrou metade; é portanto o certo para quatro.
Às vezes, por momentos, chego a invejar aqueles que, mercê de um pequeno esforço diário de método e organização, sabem sempre a quantas andam e com o que podem contar, até na sua despensa. Mas esses eventuais devaneios depressa são ultrapassados pelo subtil mas inexorável avanço do caos que, na sua missão de garantir a prevalência das leis universais da entropia, prepara afinal, na minha despensa, aquilo que o metódico jamais experimentará: a sublime aventura de descoberta do desconhecido, que se opera como se de um milagre se tratasse, a cada nova e esporádica arrumação!
Ontem, feriado a meio da semana, sós em casa, eu e minha mulher, foi dia da grande aventura. Ao princípio sempre um pouco receada, pela dimensão da tarefa, depressa se é conquistado pelo aparecer, das brumas das prateleiras e do tempo, daquelas coisas que foram compradas num determinado contexto que entretanto mudou, e logo esquecidas lá atrás, dos vestígios de gastronomias estranhas que se trouxeram de viagens passadas ou por amigos que se lembraram de nós nalguma paragem exótica. Aparecem os pomodori secchi da Toscana, ainda à espera de serem metidos em azeite, surge um grande saco com as “cascas” compradas em Bragança, à espera de uma receita que não inclua aquelas partes tradicionais, mas detestadas, do porco, outro saco com maravilhosos cogumelos Boletos Porcinni, o frasco com as preciosíssimas trufas negras, que de tão preciosas nunca mais se arranja coragem para experimentar, as caixas com os diversos exotismos, a do Sushi, a das coisas chinesas, a das coisas indianas com o seu frasco de portentoso caril comprado avulso, na rua, em Bombaim e as sempre esquecidas sementes de cardamomo, e o óleo de palma, e as estrelas de anis, e, e...
Foi destas caixas que saiu o almoço, de fusão e por força tardio.
Mas valeu a pena, oh se valeu!
Ingredientes:
300g de carne limpa de frango
2 colheres de sopa de Azeite
2+2 colheres de sopa de Óleo de Palma
2 colheres de sopa de Caril Indiano
3 dentes de Alho
5 vagens de Cardamono
2 colheres de sopa de mel
5 malaguetas “jidungo”
1 copo de leite
1 copo de grão-de-bico cozido
1/8 de ananaz
1 molho de Espargos Verdes
2 Cenouras
6 Champignons
Sal
250g de massa “cuscus” (Pisellini)
Alguns estames de Açafrão
Tomilho Limão fresco
Preparação:
Corte a carne em tirinhas como para Strogonov. Reserve.
Derreta 2 colheres de sopa de óleo de palma com o azeite e aloure nesta gordura a cenoura e os alhos, ambos cortados em pedaços. Junte a carne e salteie em lume forte, mexendo sempre. Junte o caril e o copo de leite, deixe levantar fervura, baixe o lume, tape a deixe cozer por 15 minutos. Enquanto a carne coze, esmague num almofariz, grosseiramente, as malaguetas e as sementes de cardamomo que retirou previamente das vagens. Descasque e corte em pedaços pequenos uma fatia de ananás correspondente a um oitavo do fruto. Junte então à panela as malaguetas, o cardamomo, o ananás, o copo de grão-de-bico cozido, as pontas tenras dos espargos verdes, os cogumelos fatiados e o mel. Prove e tempere de sal, tendo em conta que ainda vai evaporar parte do líquido. Deixe apurar até o molho começar a espessar.
Coza a massa em água com bastante sal, lave depois em água fria corrente e escorra. Reserve.
Toste ligeiramente no forno alguns estames de açafrão, mas sem deixar queimar e reduza-os a pó, no almofariz ou com a ponta de uma faca sobre a pedra. Adicione este açafrão a duas colheres de sopa de óleo de palma e aqueça numa panela mas sem deixar fritar. Ponha os cuscus cozidos nesta panela, envolva nesta gordura amarela e aqueça ao lume mexendo sempre para não pegar.
Sirva salpicado com folhas frescas de Tomilho Limão.
Nota:
Com a dose mencionada de malagueta, o prato fica “quente”, mas não “goês”. Se é sensível a picantes reduza a dose, se, pelo contrário, gosta destas comidas a queimar, já sabe...
As quantidades indicadas fizeram uma refeição que foi comida, à vontade, por duas pessoas e sobrou metade; é portanto o certo para quatro.
2 comentários:
Caril não há um... Há mil! Esse é mais uma prova. Vou testar com certeza, pois apreciamos muito cá em casa apesar de não termos origens goesas (mas até não me importava nada...). O grão de bico - muito indiano - conquistou-me. :-)
Abraço.
Luís, que bela produção ! E com umas trufinhas negras no armário, aí é que coisa pega !
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