Diz-se
que nada se perde de um porco e é bem capaz de ser verdade.
Do focinho à cauda, a pele, até o pêlo que no porco se
chama cerda, os ossos, únicos que são matéria-prima para esse delicioso enchido
transmontano, o butêlo, e claro, toda a carne e vísceras, lombinhos, lombo,
vão, perna e pá, pernil, toucinhos, entrecostos e entremeadas, até essas “novas” peças que
lhe descobriram, plumas, secretos e presa, tudo se come, seja preto ou branco,
tudo se aproveita no primo do javali.
Para esta 68ª Trilogia
com a Ana e o Cupido, tendo por tema o “porco”,
a dificuldade seria a escolha, já que o porco terá, porventura, mais formas de
ser feito que as lendárias mil maneiras do bacalhau.
Por mim, escolhi aquela peça que é, de entre todas, a
minha preferida, mesmo em relação àquelas ditas mais nobres, lombinhos ou
plumas, cuja excelência não ultrapassa, para o meu gosto, a suculência do
cachaço.
O cachaço é a peça que vai desde as primeiras costelas do
vão até à presa, já junto à cabeça, corresponde àquilo a que se chama o
“pescoço” do porco. Como a presa é pouco conhecida em Portugal, na prática o
cachaço acaba por incluí-la, pelo que terá toda a vantagem em adquirir o
cachaço (meio cachaço) em todo o seu comprimento ou, com mais sorte, comprando
a parte do cachaço mais perto da cabeça; na verdade isso é a presa*, deliciosa.
Ingredientes:
Cachaço de porco (corte à italiana)
Sal, pimenta, pimentão, alho em pó e louro.
Vinagre
Preparação:
Compre um cachaço à italiana ou simplesmente uma parte da
peça de onde estão a cortar as costeletas (do fundo ou cachaço, é a mesma
coisa), de preferência da parte onde o corte passa a ter mais veios de gordura,
o que quer dizer que já está na zona da presa. Se optou por esta última
hipótese, vire o lado que tem osso para baixo e dê uns golpes do outro lado,
passando assim a ter um cachaço à italiana.
Tempere e salpique com o vinagre (ou sumo de limão, para
quem não gosta de vinagre)
e leve ao forno a 80ºC, sem selar**, por cerca de cinco horas.
Retire,
aqueça o forno até aos 180ºC e volta a pôr a carne por cerca de dez minutos até
que ganhe uma bela cor dourada.
Sirva com acompanhamento a seu gosto.
Nota: * A presa, entre nós, é uma peça
pouco valorizada e até, por vezes, ouvem-se protestos do freguês, por as
costeletas do fundo que está a comprar já estarem a sair “do fim” da peça e por
isso muito cheias de gordura. Isso acontece porque aqui, felizmente, ninguém
sabe que essa zona cheia de veios gordos e de uma tenrura extrema, a presa, é
das peças mais nobres do suíno, atingindo preço idêntico a plumas ou secretos,
por essa Europa fora. É aproveitar enquanto a podemos comprar a preço de
cachaço!
** Selar uma peça que se vai cozinhar
a baixa temperatura é um dos erros mais comuns, apesar de aparecer indicado na
enorme maioria das receitas. Quando se cozinha a baixa temperatura (abaixo dos
80ºC, para a carne), esta não deve ser sujeita a qualquer choque térmico, pelo
que selá-la é contraproducente e, principalmente, inútil, já que os sucos não
são “empurrados” para fora pela ebulição (100ºC).
4 comentários:
Com um aspeto destes é um cachaço para fazer cair qualquer preconceito anti-cachaço que exista nas cabeças...
Beijinhos.
Boas tardes.
Antes de mais e... apenas para isso mesmo: muito obrigada.
Porque até já faço rissóis, num instantinho, e no meio da dúzia de doces e compotas que faço (por puro prazer de fazer e de oferecer) apaixonei-me, perdidamente, pela sua compota de laranja amarga (com as devidas adaptações às laranjas e limões aqui do quintal).
Simplesmente: obrigada.
Jinhos a todos ;*
Oi
Parece gostoso.
Beijos...
Lúcia
Ontem consegui, finalmente, arranjar um cachaço, mesmo da parte da presa. Confesso que a peça com aqueles veios todos não tem grande aspeto, acrescentando ainda que, tal como afirma no seu post, eu era dos que desprezava essa parte do porco.
temperei tal como disse mas, como o meu forno não é de confiança, coloquei-o diretamente a alta temperatura.
A carne ficou suculenta e é altamente saborosa.
Obrigado pela dica.
Cumprimentos
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