quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Cachaço Assado


                Diz-se que nada se perde de um porco e é bem capaz de ser verdade.
Do focinho à cauda, a pele, até o pêlo que no porco se chama cerda, os ossos, únicos que são matéria-prima para esse delicioso enchido transmontano, o butêlo, e claro, toda a carne e vísceras, lombinhos, lombo, vão, perna e pá, pernil, toucinhos, entrecostos e entremeadas, até essas “novas” peças que lhe descobriram, plumas, secretos e presa, tudo se come, seja preto ou branco, tudo se aproveita no primo do javali.
Para esta 68ª Trilogia com a Ana e o Cupido, tendo por tema o “porco”, a dificuldade seria a escolha, já que o porco terá, porventura, mais formas de ser feito que as lendárias mil maneiras do bacalhau.
Por mim, escolhi aquela peça que é, de entre todas, a minha preferida, mesmo em relação àquelas ditas mais nobres, lombinhos ou plumas, cuja excelência não ultrapassa, para o meu gosto, a suculência do cachaço.
O cachaço é a peça que vai desde as primeiras costelas do vão até à presa, já junto à cabeça, corresponde àquilo a que se chama o “pescoço” do porco. Como a presa é pouco conhecida em Portugal, na prática o cachaço acaba por incluí-la, pelo que terá toda a vantagem em adquirir o cachaço (meio cachaço) em todo o seu comprimento ou, com mais sorte, comprando a parte do cachaço mais perto da cabeça; na verdade isso é a presa*, deliciosa.

Ingredientes:

Cachaço de porco (corte à italiana)
Sal, pimenta, pimentão, alho em pó e louro.
Vinagre

Preparação:

Compre um cachaço à italiana ou simplesmente uma parte da peça de onde estão a cortar as costeletas (do fundo ou cachaço, é a mesma coisa), de preferência da parte onde o corte passa a ter mais veios de gordura, o que quer dizer que já está na zona da presa. Se optou por esta última hipótese, vire o lado que tem osso para baixo e dê uns golpes do outro lado, passando assim a ter um cachaço à italiana.
Tempere e salpique com o vinagre (ou sumo de limão, para quem não gosta de vinagre)
e leve ao forno a 80ºC, sem selar**, por cerca de cinco horas. 
Retire, aqueça o forno até aos 180ºC e volta a pôr a carne por cerca de dez minutos até que ganhe uma bela cor dourada.
Sirva com acompanhamento a seu gosto.
Nota: * A presa, entre nós, é uma peça pouco valorizada e até, por vezes, ouvem-se protestos do freguês, por as costeletas do fundo que está a comprar já estarem a sair “do fim” da peça e por isso muito cheias de gordura. Isso acontece porque aqui, felizmente, ninguém sabe que essa zona cheia de veios gordos e de uma tenrura extrema, a presa, é das peças mais nobres do suíno, atingindo preço idêntico a plumas ou secretos, por essa Europa fora. É aproveitar enquanto a podemos comprar a preço de cachaço!

** Selar uma peça que se vai cozinhar a baixa temperatura é um dos erros mais comuns, apesar de aparecer indicado na enorme maioria das receitas. Quando se cozinha a baixa temperatura (abaixo dos 80ºC, para a carne), esta não deve ser sujeita a qualquer choque térmico, pelo que selá-la é contraproducente e, principalmente, inútil, já que os sucos não são “empurrados” para fora pela ebulição (100ºC).

4 comentários:

anna disse...

Com um aspeto destes é um cachaço para fazer cair qualquer preconceito anti-cachaço que exista nas cabeças...
Beijinhos.

mnica ;* disse...

Boas tardes.
Antes de mais e... apenas para isso mesmo: muito obrigada.
Porque até já faço rissóis, num instantinho, e no meio da dúzia de doces e compotas que faço (por puro prazer de fazer e de oferecer) apaixonei-me, perdidamente, pela sua compota de laranja amarga (com as devidas adaptações às laranjas e limões aqui do quintal).
Simplesmente: obrigada.
Jinhos a todos ;*

Maria Lúcia disse...

Oi
Parece gostoso.
Beijos...
Lúcia

Fernando Frazão disse...

Ontem consegui, finalmente, arranjar um cachaço, mesmo da parte da presa. Confesso que a peça com aqueles veios todos não tem grande aspeto, acrescentando ainda que, tal como afirma no seu post, eu era dos que desprezava essa parte do porco.
temperei tal como disse mas, como o meu forno não é de confiança, coloquei-o diretamente a alta temperatura.
A carne ficou suculenta e é altamente saborosa.
Obrigado pela dica.
Cumprimentos