segunda-feira, 17 de maio de 2010

Yufka (Massa Filo)

.................................. Desta vez digo já, a maneira de introdução, que este é um post tão, tão pessoal que ronda o narcísico. Acontece que esta era até hoje a minha "pedra no sapato" de amador de massas, a temível yufka, a Massa Filo, fonte de uma humilhação latente sempre que tinha de comprar o triste pacotinho no supermercado.
Se esta é talvez a mais difícil das massas, melhor se compreende a alegria da sua obtenção, para mais feita com recurso à normalíssima farinha 55 de todos os dias que, teoricamente, nunca o permitiria.
Este post será, na realidade, dividido em 4 partes: 1º- obter a massa; 2º- fazer o Filo; 3º- compor um prato; 4º- aproveitar sobras.
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Ingredientes:
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500g+200g de Farinha de trigo, sem fermento.
1/2 ovo pequeno batido
1 colher de chá de óleo
1 colher de chá de sal
Água fria
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Preparação:
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Amasse 500g de farinha com agua até obter uma massa lisa e com consistência de massa de pão.
O problema usual para a massa Filo é a inexistência no mercado português de semolinas, ou farinhas de trigo duro que, por terem muito mais glúten que as farinhas usuais de trigo mole, dão massas muito mais elásticas e resistentes à ruptura quando muito esticadas.
Para obviar este problema vamos concentrar o glúten da nossa massa, lavando-a em água fria.
Mergulhe a massa num alguidar e manipule-a. Verá a água tornar-se cada vez mais leitosa e à superfície da massa começam a formar-se uns borbotos mais escuros,
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continue a manipulação e à medida que a massa vai deixando o amido na água, vai diminuindo de volume e tornando-se muito mais castanha e com esta consistência estranha,
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por fim terá um jarro de "leite" e uma massa muito rica em glúten e que terá cerca de metade do peso inicial.
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Junte então farinha a esta massa, o ovo batido, sal e óleo e amasse muito bem até obter uma massa muito trabalhada e elástica. Deixe-a descansar por 3 horas, no frigorífico.
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Retire uma pequena porção de massa, como uma noz,
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passe-a para a bancada enfarinhada e, com o auxílio de um rolo comprido e muito fino (usei um tubo de alumínio pouco mais grosso que um lápis, mas não é preciso tanto), abra a massa até ela ter a espessura que se usa para os rissóis.
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Enfarinhe bem a superfície da massa e enrole-a no próprio rolo.
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Este é o passo fulcral: aqui é que ela estica ou não.
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Coloque os dedos sobre a massa enrolada e faça uns movimentos de vai-vem, curtos mas a fazer força de pressão na massa para os lados, do centro para os lados.( veja o vídeo do turco).
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Desenrole a massa várias vezes, enfarinhando sempre e voltando a enrolar e esticar. Das primeiras vezes ainda fiz uns rasgões, depois.... voilá:
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Massa Filo, da espessura de uma folha de papel ou da espessura que quiser, na quantidade que quiser, quando quiser...
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Na verdade a idéia era apenas tentar fazer a massa. Acho que nem eu acreditava que desta vez ia conseguir mas o certo é que tinha ali belas placas de filo e uma vontade irresistível de experimentá-la. Foi com o que havia à mão: umas fatias de queijo e de fiambre, massa de uma farinheira que ali andava pelo frigorífico, assim se compôs um almoço leve, barrando uma placa de filo com azeite, dispondo o recheio, enrolando e levando por 30m ao forno a 165º. Ficou assim e mais houvesse mais iria!
Ao jantar fiz um strudel doce de minha criação, ficou um espanto mas era experiência e não fotografei; um dia repito e trago-vos aqui.
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Agora, como prometido lá muito para cima, o aproveitamento de restos, uma das coisas que mais me encanta na cozinha.
Lembram-se da água em que lavaram a massa inicial, aquela que ficou como leite?
Essa água está carregada de amido de trigo. Deverá passar-se por um passador de rede fina para reter algum pedaço de glúten que se tenha soltado, depois deve ficar em repouso num jarro alto onde, ao fim de 2-3 horas fará um grosso depósito branco no fundo,
Decante a água superior e ponha o depósito a secar num prato largo, solte os pedaços de amido que se formam e passe-os pelo almofariz
depois por uma peneira. Obtém assim, uma "maizena" apta para todos os fins desta.





Claro que me poderão dizer (e dirão!) que é preciso muita pachorra para fazer Maizena em casa e têm razão, pois claro. Claro que eu podia ser como toda a gente e ir comprar um pacote por uns tostões mas também é claro que não tinha aquela graça!

6 comentários:

Miguel disse...

O LPontes não se rende mesmo à dificuldade, aliás vejo nos seus posts que faz delas desafios. Admiro-o por esse seu espirito do "hei-de conseguir fazer isto", nem que falhe 100 vezes! Mas à 101ª acerto. Como diz, ninguém se lembraria de fazer maizena em casa nem a massa filo! Mais uma vez parabéns por nos surpreender. Contamos com as suas novidades.
Um abraço.
Miguel
http://cozinha-sem-tabus.blogspot.com/

Isabel I disse...

Não sabe o quanto admiro a sua persistência e a sua habilidade, eu que sou mais de facilitar. Parabéns pela massa e pelo resto, deve saber bem poder dizer: - Eu fiz!

Susana Gomes disse...

Formidável!
Parabéns pela persistência e pelo resultado fantástico. :)

jp diniz disse...

ora aí está uma coisa que eu nunca arriscaria e agora fiquei a remoer

Moira - Tertúlia de Sabores disse...

É a isso que eu chamo coragem!
Acho que nunca me arriscaria a fazer massa filo, mas por outro lado ficou por aqui um bichinho a azucrinar-me a orelha ...

Unknown disse...

Bravo, bravo, bravo. Este blog é o melhor que tenho consultado. É o que procurava, e encontrei! A propósito do Strudel, sabe, vou experimentar com "farinato" e mel (Farinato: enchido espanhol, do distrito de Salamanca, concretamente da zona de Ciudad Rodrigo). Estou a adorar ler as suas propostas, curiosidades, receitas antigas, inovações, laboratoriosidades... magnífico! a propósito da cabeça de xara: eu prefiro incluir mais língua e alguns frutos secos (castanha de caju, alguns corintos e pistácios). Acompanhado de brioche é o paraíso de uma merenda (pena que este termo esteja esquecido)
Parabéns.
Aida