O ceviche é um prato
não-canónico, como todos os pratos de origem popular, e a sua única
característica é ser o peixe ou marisco crus cozinhados pelo ácido cítrico do
sumo das limas ou limões, originalmente até que as proteínas coagulassem, nisso
diferindo dos nossos alimados em que esse papel do ácido cítrico é substituído
pelo ácido acético dos vinagres.
Hoje, a tendência geral de
simplificação quase que acabou com essa prática e os ceviches por todo o mundo
são apresentados como peixe efectivamente cru apenas temperado pelo sumo
cítrico durante segundos, perdendo-se assim a delicadeza obtida pela cocção
cítrica e ganhando-se essa “vantagem” que é hoje por quase todos incensada, a
rapidez de preparação em vez das duas horas dos ceviches originais. Na época da
pressa e do lucro, ganhou o ceviche cru!
Para mim, que não tenho de
despachar ceviches para conseguir servir muitos clientes antes da hora de
fechar e que nunca esqueço o tempo como ingrediente essencial do que cozinho,
um ceviche (como um alimado) é um prato de peixe cozinhado e não um prato de
peixe cru temperado com um sumo ácido durante dois minutos. Este que hoje vos
trago e que ficou a raiar o divino, associou o portuguesíssimo sabor de um
tempero injustamente esquecido e que, apesar de alentejano, parece ter sido
criado de propósito para acompanhar peixe: A Hortelã da Ribeira.
Faço ceviches com muitos peixes,
como aqui tenho deixado ao longo dos anos mas nenhum me satisfaz com a
intensidade do ceviche de Peixe-Galo. A sua carne firme e de sabor único,
normalmente associada aos filetes, transforma o habitual prazer de um ceviche
numa experiência celestial.
Ingredientes:
Peixe-Galo
Sal
Pimenta
Sumo de limão (ou de lima)
Hortelã-da-Ribeira
Chalota
Malagueta
Pimento vermelho
Batata
Azeite
Flor de poejo fresca
Flor de sal
Preparação:
Compre um peixe-galo inteiro, isto é, que tenha tripas e ovas,
rejeitando
aqueles que se apresentam já eviscerados e com um golpe ventral, sinal de menor
frescura pois são animais que foram importados ou, pelo menos, que passaram já
pela manipulação da retirada das ovas para serem transformadas em sucedâneo de
caviar pela indústria espanhola.
Esfole
e retire os filetes (ou
mande fazê-lo), depois corte-os em cubos com cerca de 1-1,5cm de lado.
tempere, misture, e cubra com sumo de limão. Deixe marinar durante cerca de duas horas* , durante as quais o peixe vai passar por uma transformação dramática, desde o translúcido inicial de peixe cru
ao magnífico nacarado branco final do ceviche pronto.
Servi com um puré de batatas trasmontanas
esmagadas a garfo e misturadas com flores de poejo, azeite virgem
e flor de sal
no fim.
Notas: * Se quiser seguir a onda moderna e apresentar o seu ceviche
como hoje se come em praticamente todo o lado, abrevie as duas horas para um ou
dois minutos. A carne firme do peixe-galo é também excelente comida crua.
7 comentários:
Fiquei cheio de vontade de experimentar o ceviche de peixe-galo e sobretudo esse puré de batata com flores de poejo...
Bolas, que só agora vejo q voltaram as boas comidas.Tb andei por aí distraído - mas sem likes q é coisa de q não gosto - e só quando vim a ver de coisas antigas percebi q o bom voltou. Ainda por cima com comentários do Luis Pedro.Tou em casa.Tou bem.
oh João, com a excitação até me saiu o nome do meu sobrinho Luis... abraço Edmiro
Vim parar a este cantinho (que é um regalo de aromas e também um regalo para a vista) por vir atrás de uma receita de Sericaia com ameixa e, na impossibilidade de deixar lá nesse post um abraço ao Luís, vim fazê-lo aqui.
Vou ter de passar por aqui mais vezes.
Um abraço e tudo de bom
(^^)
será um problema fotográfico ou isso é um galo branco ?
O que eu gostava de saber é onde se compram batatas transmontanas...
Bem haja
antónio
Caro Diogo, não lhe achei diferença em relação aos peixes-galo que costumo comprar, era prateado com reflexos irisados a atirar para o amarelo. A palidez na foto deve ser da muita luz ambiente e da inépcia do fotógrafo, eu. :-)
Castrantonio, eu compro batatas transmontanas a uma vendedora de hortaliças do mercado da Ajuda, aqui ao pé de casa. Um dia, em conversa, ela deixou escapar que em casa dela não entrava uma única da "porcaria de batatas" que ela própria ali vende, mas que os clientes preferem às sujas e feias batatas de Trás-os-Montes que traz da "terra" para seu consumo. Passou a trazer também para mim e são a melhor imitação que eu conheço, da inimitável batata galega.
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