domingo, 7 de fevereiro de 2010

Uma Alentejana Diferente

..........Hoje, quando passamos por essa fronteira entre Baixa e Mouraria, a Praça da Figueira, poucos sabem que esta "praça" chama-se assim, não por ser mais uma praça urbana, mas porque albergou durante dois séculos o maior e mais emblemático mercado de Lisboa: A Praça da Figueira.
De planta quadrada, a lembrar o estilo do Bolhão e dos grandes mercados de Barcelona, nasceu em 1755, nos terrenos onde o terramoto arrasou o Hospital de Todos os Santos e lá ficou até 1949.
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A vocação comercial manteve-se, agora já não no centro, ocupado pela estátua de D.João I, mas toda à volta, em casas tão antigas como o Hospital das Bonecas, a Pastelaria Suíça, a Antiga Casa do Bacalhau, a Confeitaria Nacional e, no 10-B, esse curioso supermercado de bairro, o Praça da Figueira.
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Visto por quem passa na rua, o Praça da Figueira resume-se a uma espécie de frutaria em que se habituaram a ver, a preços módicos, espécies diferentes, bananas vermelhas, mandiocas e inhames diversos, coisas de que nem sabemos uso e nome, mas, vencido esse corredor frutícola, abre-se lá para dentro um supermercado onde, a par de tudo o que é normal num pequeno supermercado de bairro, se vendem os melhores cogumelos frescos de Lisboa!
Fresquíssimos, grandes e maciços, ainda com o pé inteiro e com pedaços de micélio, a um incrível preço de €2.49 o quilo, vendem-se ali todos os dias pilhas de caixas, só de manhã que à tarde já não há.

Um dos pratos mais conhecidos da gastronomia alentejana é, curiosamente, um prato algarvio. Falo da famosa Carne de Porco à Alentejana, prato que nem poderia sê-lo, pois onde iriam buscar as amêijoas, produto típico de rias e estuários calmos? José Quitério conta-nos a história* no fim e eu conto-vos como faço uma "Alentejana" deliciosa sem amêijoas e sim com os cogumelos do Praça da Figueira.
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Ingredientes:
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600g de carne de porco, da perna
400g de cogumelos
Alhos, louro, sal, pimenta, vinho branco e massa de pimentão
Banha de porco
Batatas e salada
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Preparação:
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Parta a carne em pedaços do tamanho de uma noz pequena e tempere-a com a vinha de alhos indicada com, pelo menos, 24 horas de antecedência.
Frite a carne em banha, primeiro com lume forte, depois em lume médio/baixo até estar bem cozinhada e o molho apurado.
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Junte então os cogumelos inteiros ou partidos ao meio, consoante o seu tamanho e cozinhe em lume forte durante 1-2 minutos, mexendo sempre. Pode ainda juntar também coentros picados, como na "Alentejana" das amêijoas, embora eu prefira só assim, sem a tirania do coentro sobre o sabor delicado do cogumelo pouco cozinhado.

Sirva com batatas fritas em azeite e salada a gosto.
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Nota histórica: * "Vamos dar o seu a seu dono: o que se chama em todo o país carne de porco à alentejana é efectivamente do Algarve. A coisa deu-se porque o porco algarvio da beira-mar, muitas vezes alimentado com peixe, não gozava de boa fama.
Perante as reclamações dos comensais ao então gosto assardinhado da especialidade local CARNE DE PORCO COM AMÊIJOAS, as casas de pasto algarvias passaram, em determinada altura, a recorrer aos porcos do Alentejo e a anunciar "Carne de porco alentejana com amêijoas".

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Quitério, José - Livro de Bem Comer, 1996, Almedina, pp.63
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3 comentários:

Paula disse...

Uma versão a não perder...

Luís Chaves disse...

boa noite,

Conhecia uma versão diferente da história, contada por uma algarvio. As amêijoas serviam exactamente para desculpar o travo "a mar" do prato que, sendo feito com carne porco algarvio, alimentado com peixe e subprodutos da industria conserveira, era apresentado como porco alentejano.
Uma vez mais, obrigado e parabéns.

A Mim Me Parece disse...

Já ando por aqui há uns anitos mas só hoje atentei nestas duas versões históricas sobre a origem genealógica da "carne de porco alentejana" vertidas nesta caixa de comentários por dois Luíses.
Eu por mim inclino-me mais para a versão do Luís Chaves que trás a vantagem de carrear com ela a matreirice congénita do mouro algarvio.
Aproveito a oportunidade muito rara de estar a comentar para me juntar à legião de comentadores deste blog que, muito justamente, louvam este abnegado trabalho do Luís Pontes e lhe agradecem que o partilhe connosco. Estou com eles. O meu muito obrigado e bem haja.

José Mocica