quarta-feira, 21 de julho de 2010

Ananases, "abacaxis" e carne tenra


.................... Com o seu peculiar bairrismo militante e gosto desmesurado pelos superlativos, os portugueses, não contentes por terem um dos melhores, quiçá o melhor ananás do mundo, o ananás açoriano produzido em S.Miguel, logo quiseram também açambarcar o próprio nome do aromático fruto!
Sim senhor “Ananás há só um, o dos Açores e mais nenhum!”.
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Caiu-se assim no ridículo parolo de passar a chamar ananás só ao dos Açores e “abacaxi”, o termo brasileiro para ananás, a todos os outros. .
De facto há apenas uma espécie de ananás cultivado para consumo, o Ananas comusus, do qual se conhecem algumas dezenas de variedades e se cultivam meia dúzia.
O ananás dos Açores é de uma das variedades mais cultivadas em todo o mundo, a Cayenne e deve as suas portentosas qualidades de sabor e até morfológicas à impecável técnica com que é produzido nas estufas de S.Miguel.
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É provável que o leitor já se tenha perguntado porque é sempre tão impecavelmente tenra a carne apresentada pelos restaurantes chineses, para mais quase sempre bem passada? De facto eles abastecem-se de carne nos supermercados da zona, exactamente como todos nós.
O segredo é o uso de uma enzima natural, extraída do ananás, a bromelaína, que actua quebrando as cadeias proteicas, atenrando assim o bife mais duro.
É esta acção de cortar as extensas moléculas proteicas que faz com que frutos como o ananás fresco, o figo, o kiwi ou a papaia impeçam a gelatina de solidificar ou que se use embrulhar a carne em folhas de papaia nos continentes africano e asiático.
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Assim, se, como eu, gosta de comer sempre carne tenra e, como eu, não pode comer no dia-a-dia só carne do lombo de vitelas Mertolengas, Barrosãs ou do Yorkshire, pode sempre usar esse truque de química caseira inofensiva e eficaz que consiste em marinar a carne rija por umas horas em ananás fresco moído, depois lavá-la e cozinhá-la como quiser.
Se quiser ter ainda menos trabalho a bromelaína de ananás vende-se nos supermercados de produtos asiáticos e é só usá-la meia hora antes da confecção, como se de pimenta se tratasse.
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Ingredientes:
Metade de um ananás (claro que não-açoriano)
1 copo de vinho branco

Preparação:
Retire as folhas e o pé coriáceo ao ananás, parta em bocados com a casca e o talo central e passe no liquidificador com o copo de vinho.
Cubra a carne a atenrar com esta papa e deixe por 3 a 6 horas, de um dia para o outro em casos de dureza extrema.
Lave e cozinhe a carne.
... e agora que isto vai estando "de ananases", vou de férias, ficando o blog a descansar até 16 de Agosto.
Boas férias!!!

9 comentários:

anna disse...

As coisas que se aprendem aqui, contigo...
Hoje vou de queixo caído!
Beijinhos.

Catarina disse...

adorei a explicação...

boas férias!**

jvcosta disse...

Não sei se essa atitude propagandística inexacta em relação ao ananás dos Açores não tem uma razão psicológica simples. O Luís tem toda a razão: o ananás de S. Miguel foi importado, não é nenhuma variante especial. O que tem de especial é a técnica de cultivo.

isto tem duas consequências, importantes hoje para a "psicologia" do mercado. Primeiro, é muito caro mas com qualidade proporcional ao preço, mas admito bem que só um paladar bem educado é que valorize este aspecto de qualidade preço.

Segundo, é "artificial", numa época em que o que está na moda é o natural a 100%, mesmo quando isto signifique degenerescência genética de qualidade, falta de estandartização (sem que se saiba se uma maçã é igual à outra), até risco de bicheza.

Jojojoli disse...

É verdade ou mito que o ananás dos Açores é tradicionalmente menos doce que o "abacaxi"?
Cumprimentos

Luís Pontes disse...

Caro Joli,
É realmente um mito.
O que se passa é que o ananás dos Açores tem um sabor forte e uma acidez elevada, que mascara um pouco a doçura e o torna tão bom.
Além disso, como é bastante caro, demora a vender-se o que faz com esteja frequentemente na fase "cor de laranja". Os ananases, ao contrário da maioria dos frutos que vão sempre aumentando os teores de açúcares com o amadurecimento, tem o seu pico de doçura ainda na fase verde, começando a perder açúcar (e sabor)com a passagem a laranja.
Veja o que escrevi em http://outrascomidas.blogspot.com/2008/05/como-escolher-um-anans.html sobre esse assunto.

Jojojoli disse...

Muito obrigado. Quando for às compras com a minha mulher, já vou fazer um brilharete.
Cumprimentos,
Jorge Nunes

Pastifício dell'amore disse...

Tinha dado parabéns ao blog em post antigo, então vai novamente.

Pedro Cruz Gomes disse...

Parabéns, gostei!

Unknown disse...

Estou farta de aprender, Luís!
Obrigada :)

Isabel Matos

www.doacucarcomamor.blogspot.pt