A
canela, seja a legítima, da caneleira do Sri Lanka, seja a sua prima mais
vulgar, da cássia chinesa ou de Myanmar, é uma especiaria omnipresente nas
cozinhas orientais, sendo ainda utilizada um pouco por todo o mundo.
Em Portugal, contudo, o seu uso está muito restringido à
doçaria, sendo que as únicas utilizações tradicionais de canela em pratos de
carne, encontram-se na Madeira e nos Açores, quiçá por terem estado de há muito
em contacto com gentes de outras paragens.
Talvez porque tive um tio-avô que, sendo militar, esteve na
ilha Graciosa de 1929 a 1934, tendo consigo a minha tia
Lucinda, a das farinheiras de que vos falei aqui, havia na cozinha da minha
infância o hábito de se temperar carne de porco com canela, principalmente as
costeletas.
Sendo esta 79ª Trilogia
com a Ana e o Amândio, submetida ao tema “canela”,
decidi recriar estas costeletas da infância, acompanhando-as de um arroz de
canela de estilo iraniano, experiência incerta que se veio a revelar de
inspiração ao resultar num prato de invulgar requinte e que, mais não fosse,
deixou toda a casa perfumada como se por raro incenso.
Ingredientes:
Costeletas do cachaço
Canela moída
Alhos e louro
Sal e pimenta
Vinho branco
Banha de porco (ou outra segundo o gosto ou necessidade)
Arroz Suriname*
Cebola e alhos
Óleo vegetal
Canela em pau
Anis estrelado
Açúcar mascavado ou mel
Sal e pimenta preta
Gengibre em pó
Açafrão em estames
Pimenta da Jamaica em grão
Sultanas
Nozes e amêndoas com a pele
Vinagre balsâmico ou outro fraco como o de malte
(facultativo)
Preparação:
Peça que lhe cortem as costeletas grossas, sensivelmente o
dobro do que é habitual.
Tempere-as de um lado com alhos laminados, louro, sal e
pimenta, e do outro com canela moída.
Frite-as então em lume forte dos dois lados e, quando
estiverem já com cor, junte vinho branco e vá fazendo uma fritura balanceada,
acrescentando mais vinho sempre aos poucos e só com quando o anterior
desapareceu e começou de novo o processo de caramelização dos sucos. Ao longo deste
processo os alhos vão também fritando-cozendo ciclicamente e cerca de 30m
depois acabam por se desfazerem ficando incorporados no molho.
Enquanto decorre o lento processo da fritura das
costeletas, leve ao lume num fundo de óleo neutro (p.ex., girassol ou amendoim),
todos os ingredientes do arroz, excepto o próprio arroz, o vinagre e as nozes e
amêndoas. Use sempre mais canela que anis, para que seja esse o aroma
dominante.
Quando a cebola ficar translúcida, introduza então o arroz
Suriname*, vá mexendo até que, por sua vez, também ele fique translúcido e adicione
então a água, que deve ser em dobro do volume de arroz.
Deixe em lume mínimo até estar completamente seco, o que,
para o arroz Suriname, leva cerca de 16-17minutos. Então, se gostar de fazer um
corte fresco ao adocicado do arroz, adicione um golpe de vinagre fraco** (balsâmico,
de cidra ou, melhor ainda, de malte), junte nozes e amêndoas grosseiramente
picadas e mexa bem antes de servir.
Para terminar as costeletas, deixe caramelizar uma ultima vez o
molho e adicione agora água em vez de vinho branco. Agite bem para desglaçar e
emulsionar, ficando o molho grosso e delicioso. Use-o sobre a carne, no prato.
Notas:
* O arroz agulha Suriname é uma
descoberta, para mim recente e que me tem encantado, sendo eu um quase-fanático do arroz
Carolino. De facto, embora se possa fazer realmente tudo com esse nosso magnífico
arroz do Mondego ou de Alcácer do Sal, é verdade que fazer um carolino solto
bago a bago, sem o lavar, é uma tarefa com alguma sofisticação e trabalho.
Este arroz
Suriname é um arroz de bago longo e isento de goma, que tem o comportamento do
arroz agulha (mas não a sua terrível insipidez) ou do basmati (mas não o seu
perfume a flores) e o sabor a arroz…. Carolino.
O melhor de dois mundos quando
o objectivo é um arroz bem solto.
** Use o vinagre apenas se lhe
desagradar o adocicado geral do arroz. Não use vinagre de vinho (6º) para que o
seu arroz perfumado a canela não fique com um toque de arroz de cabidela.
2 comentários:
Andámos pela porco e canela desta vez... nem sei se gostei mais das costeletas se do arroz.
Eu não acho que o agulha sofra de «terrível insipidez»... mas ok hei-de provar o tal Suriname.
Beijinhos.
Olá!
Somos seguidores das suas receitas e é a primeira vez que lhe estou a escrever um post. Amei as costeletas, fizemos com carninha do cachaço! Óptima para o colesterol :P
Enviar um comentário