domingo, 16 de julho de 2017

Cozido galego

        Por muito que sejamos tentados a enaltecer a excelência dos “nossos” cozidos, o facto puro e duro é que o mundo está cheio de cozidos igualmente excelentes, todos bastante parecidos na sua essência .        
Seja um cozido à portuguesa, seja o cocido madrileno, um pot au feu, o famoso de Lalin ou o cozido galego, o que faz de cada um uma referência única é o uso dos ingredientes próprios da sua região.
O que distingue um cozido galego, afinal tão parecido com o cozido do Alentejo, são as batatas galegas, as carnes e enchidos galegos, a “falta” da farinheira e da morcela alentejana, as subtis diferenças entre um repolho galego e um repolho
alentejano. Subtis mas poderosas diferenças!
A única maneira de reproduzir um cozido galego sem estar lá é usando os produtos de lá. Foi o que fiz.
Regressado há dias da Galiza, decidido a conseguir reproduzir aqui esse sabor único, trouxe comigo as carnes salgadas, os repolhos, até as batatas (e que inimitáveis elas são).
O cozido galego é, como quase todos os cozidos por esse mundo fora, um prato pesado e quente, ideal para os dias frios do Inverno. Infelizmente, agora é que eu fui à Galiza e os ingredientes não são coisa que se congele impunemente. Moderou-se o apetite, escolheu-se uma sombra fresca e aprazível para a refeição, afinal nem foi pesado e, apesar dos calores deste Julho, muito bem soube este cozido galego!

Ingredientes:

Pernil de porco fumado
Unha de porco fumada (cabeça, orelha, etc., fumadas)
Toucinho fresco
Chouriço
Entrecosto salgado
Carne de vaca galega, da perna (na falta, Barrosã)
Peito de frango
Batatas galegas ( na falta, de Trás-os-Montes)
Couve repolho
Couve galega, folha larga
Grãos Pedrosillanos (na falta, grão normal)
Pimentão doce fumado (de La Vera)
Pimentão picante fumado (de la Vera)
Sal

Preparação:

O cozido galego é um cozido de uma só água, isto é, todos os ingredientes são cozidos no mesmo caldo.
Dois ou três dias antes, ponha as carnes fumadas de molho, abra ao meio a unha fumada e vá mudando as águas para dessalar e retirar a cor castanha exterior que iria escurecer o caldo. Na véspera ponha também de molho as carnes salgadas e o grão.
No dia da confecção, comece por pôr ao lume, em frio e coberto de água, o pernil de porco fumado e deixe ferver por cerca de uma hora.
Introduza então as restantes carnes, excepto o peito de frango, o chouriço e o grão bem demolhado e embrulhado num saco de pano de modo a não se espalhar pelo caldo.
Deixe ferver mais uma hora, sempre cobertos de caldo, após o que adiciona as batatas, as couves, o peito de frango e os pimentões em pó, sendo o doce em dobro da quantidade do picante.
Prove o caldo e rectifique sal e o que quiser.

Deixe cozer em lume muito brando por mais meia hora e sirva de imediato sendo as carnes numa travessa,
os vegetais noutra
e o grão separado.

sábado, 15 de julho de 2017

Couve com toucinho

               É daqueles pratos de que nunca se leu ou ouviu falar e que morrerá com a memória dos últimos que o comeram em tempos infaustos e famintos que se prefere não lembrar, a não ser por terem sido os tempos em que se foi criança e esses, os tempos e os seus sabores, são sempre os melhores de uma vida.
De seu nome Maria Bárbara, fugiu desse fado maldito que a rodeava na Semblana natal, lá para as bandas de Almodôvar e veio quase criança para Lisboa.
Não trouxe dinheiro, não trouxe letras, mas trouxe para toda a vida as recordações dos sabores da aldeia, as açordas simples que não figuram em nenhum livro ou recolha e estas couves com toucinho, ideia gulosa que só se faz quando chega alguma encomenda com os cheiros e o toucinho, aquele toucinho que só há na Semblana.
Fica pois aqui esse prato, rei da simplicidade com os seus dois ingredientes, mas cheio de memórias e evocações da meninice alentejana de Maria Bárbara.

Ingredientes:

Toucinho salgado de porco preto
Couve

Preparação:

Coza demoradamente pedaços de toucinho salgado,
tendo o cuidado de usar a grossa camada de sal que o cobre como tempero do cozinhado.
Quando o toucinho estiver bem cozido e o caldo, que deve ser escasso, bem cheio da sua gordura, retire-o e junte folhas de couve lombarda ou repolho. Reponha o toucinho por cima
e leve ao lume até as couves estrem cozidas a seu gosto.
Sirva as couves e o toucinho com algum caldo e acompanhe este sabor de outros tempos com uma fatia de pão alentejano.